Segundo peritos, sistema de freios do lado direito do veículo 'apresentava desgaste antigo'. Acidente foi em março de 2022. g1 tenta contato com empresa proprietária do ônibus.
A perícia feita no ônibus que tombou em uma ribanceira e matou 11 pessoas na PR-090, em Sapopema, Norte Pioneiro, revelou que o sistema de freios do lado direito da frente do veículo "não estava funcionando adequadamente".
O laudo pericial está no inquérito policial que investiga o acidente, que aconteceu em 30 de março de 2022. O documento foi obtido pelo g1 com autorização da Vara Criminal de Curiúva, onde tramita o processo.
Além das 11 pessoas que morreram, outras 20 ficaram feridas. Os trabalhadores saíram de Três Lagoas (MS) e iriam trabalhar em uma indústria de papéis e embalagens em Telêmaco Borba, nos Campos Gerais.
De acordo com a Polícia Rodoviária Estadual (PRE), o veículo saiu da pista, capotou diversas vezes e parou em uma ribanceira a cerca de 80 metros.
"Ao avaliar o conjunto dos sistemas de freio posterior direito, observou-se que, tanto a superfície interna do tambor quanto a superfície das lonas, apresentavam camadas de poeira, concluindo-se dessa forma que o mesmo não estava funcionando adequadamente.
Como tal circunstância não foi observada nos demais tambores e lonas, conclui-se que, no momento do acidente, o veículo apresentava capacidade de frenagem reduzida", dizem os peritos no laudo.
A distância de frenagem é a aquela percorrida pelo veículo do momento de acionamento dos freios até a parada total dele.
O laudo
A perícia analisou todos os freios "após informações de que eles estavam em situação irregular", como escreveram os peritos no documento. Para fazer a análise, foi necessário desmontar as peças.
Ao verificarem o sistema de freio do rodado posterior direito do ônibus, os peritos encontraram:
De acordo com a perícia, "embora não seja possível afirmar que o acidente foi causado única e exclusivamente devido às não conformidades observadas no sistema de freio do veículo, é possível inferir que o veículo não realizou as manutenções corretivas e preventivas adequadamente".
O ônibus
O ônibus pertence à frota da empresa Engemec, que havia contratado os trabalhadores. Segundo uma petição enviada pela defesa da entidade à Polícia Civil, o veículo foi fabricado em 2007.
No documento, os advogados da Engemec dizem que o ônibus foi comprado de outra empresa de Dracena (SP) em março de 2021.
De acordo com a petição elaborada pela defesa, "quem realizava a manutenção preventiva e corretiva era o próprio motorista, o Sr. Adilson Dias. Os reparos eram efetuados por empresas terceirizadas, conforme atestam as notas fiscais de aquisição de peças e serviços juntadas neste ato".
O g1 procurou a Engemec por várias vezes para obter uma manifestação sobre a conclusão da perícia nos freios do ônibus, mas não teve retorno.
'Virei uma garrafa pet dentro do ônibus'
Natural da Bahia, o mecânico Genílson Simões do Espírito Santo é um dos 20 sobreviventes do acidente.
Em entrevista ao g1, ele contou atuava como uma espécie de líder no grupo que viajava até Telêmaco Borba, e que ajudou a empresa a selecionar os trabalhadores.
Genílson disse que havia acabado de sair do banheiro e seguia para o assento dele quando o ônibus tombou. Foi arremessado vários metros por conta do impacto e permaneceu acordado enquanto as vítimas eram socorridas.
"Eu não apaguei durante o acidente. Tinha acabado de sair do banheiro e estava voltando para o meu lugar. Foi Deus que não deixou eu colocar o cinto de segurança. Eu estava na segunda poltrona, assim que coloquei a mão, houve a batida e virei uma garrafa pet dentro do ônibus. Eu recordo de tudo. Fui dormir depois de uns 15 dias", relembrou.
O mecânico explicou que sofreu fraturas na bacia, costelas, braços e outras partes do corpo. Ele ficou 30 dias internado entre hospitais de Bandeirantes e Londrina, onde passou por diversas cirurgias.
As lembranças do acidente estão nos pinos que colocou no antebraço esquerdo e na muleta que usa para caminhar. Genílson garantiu que o ônibus não apresentava as melhores condições de conservação.
"Na visualização de cada um que viajava, o ônibus não tinha condições de fazer uma viagem nesse longo trajeto. Se você olhasse bem, tinha poltronas sem cinto, que 'arriavam' de uma vez. No dia-a-dia da empresa a gente estava nesse ônibus. Não sabíamos se tinha uma manutenção adequada, se estava tudo em dia", disse.
Sem autorização para transporte interestadual
Dias após o acidente, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) informou que o ônibus não tinha autorização para transporte interestadual dos trabalhadores.
Segundo a Agência, o motorista Adilson Dias, de 52 anos, não era cadastrado junto ao órgão. Ele morreu no acidente.
Conforme a ANTT, o veículo também não possuía a apólice de Seguro de Responsabilidade Civil, documento obrigatório para o transporte de passageiros.
A investigação
Um ano e sete meses após o tombamento, o inquérito aberto da Polícia Civil ainda não foi encerrado. A investigação é de responsabilidade da Delegacia de Curiúva, cidade próxima a Sapopema.
Segundo o delegado Mikail Moss Horodecki, 24 pessoas prestaram depoimento, entre sobreviventes, representantes da empresa proprietária do ônibus e policiais envolvidos na ocorrência.
O delegado explicou que a falta de manutenção em um dos freios contribuiu para o acidente.
"O freio de um dos rodados do ônibus estava inoperante, fato esse que contribuiu para o superaquecimento dos freios durante a descida na serra. Ao perder a eficiência de frenagem, o ônibus atingiu 120 km/h, vindo a sair da pista e capotar. Temos que o principal responsável do acidente foi o próprio motorista, que seria o responsável pela sua manutenção e empregou velocidade excessiva".
Horodecki afirmou que o inquérito está em fase final para verificar se houve algum tipo de negligência por parte dos integrantes da empresa responsável pelo veículo.
Quem são as vítimas