No dia 7 de abril é comemorado o Dia do Jornalista. A data, que foi estabelecida em 1931 pela Associação Brasileira de Imprensa para legitimar a atuação e assegurar direitos dos jornalistas, vem ganhando um propósito diferente nos Ășltimos anos: denunciar ameaças, ataques e agressões contra a categoria, que não param de crescer.
De acordo com o mais recente levantamento realizado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), em 2021 foram contabilizados 430 casos de violĂȘncia contra os profissionais da ĂĄrea. O Relatório da ViolĂȘncia contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa mostra que 2021 foi o segundo ano consecutivo com recorde de registros desde que a série histórica começou a ser feita, na década de 1990. Em 2020, foram 428 casos.
A pesquisa aponta que a censura é, atualmente, o tipo de violĂȘncia mais comum sofrido pelos jornalistas. Foram registradas 140 ocorrĂȘncias, representando 32,56% do total de casos, enquanto a descredibilização da imprensa – que chegou a liderar a lista em levantamentos anteriores respondeu por 30,46% – foram 131 ocorrĂȘncias no total.
Agressões fĂsicas e verbais são disparadas de todas as partes, e o "campeão" nesse quesito é o próprio presidente da RepĂșblica.
A presidente da Fenaj, Maria José Braga, diz que os nĂșmeros são alarmantes, e a entidade acredita que haja ainda mais casos. "Nós acreditamos que hĂĄ uma subnotificação. Muitos não denunciam, principalmente quando as agressões são feitas por meio virtual", explicou.
Bolsonaro é o maior agressor
Segundo o relatório, o presidente Jair Bolsonaro (PL) foi o principal agressor em 2021. Sozinho ele foi responsĂĄvel por 147 casos (34,19% do total), sendo 129 episódios de descredibilização da imprensa (98,47% do total de registros desse tipo de violĂȘncia) e 18 agressões verbais.
É o terceiro ano seguido que Bolsonaro é o maior agressor em casos registrados pela Fenaj. Durante uma coletiva de imprensa, em 2020, ele chegou a disparar a seguinte fala a um repórter: "Vontade de encher a tua boca com porrada". No PalĂĄcio da Alvorada, ele também mandou os profissionais "calarem a boca".
Para a presidente da Fenaj, a postura de Bolsonaro, além de ser violenta, "impulsiona que os seus apoiadores também agridam jornalistas e atuem para descredibilizar a imprensa. É um processo preocupante porque se trata de uma instituição da RepĂșblica, incentivando, sim, agressões contra jornalistas", afirmou.
Nesta semana, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente, recebeu inĂșmeras crĂticas ao debochar de tortura sofrida pela jornalista Miriam Leitão durante a ditadura. No Twitter, ele disse sentir "pena da cobra" que torturou a jornalista. Miriam passou horas trancada em uma sala com uma jiboia, além de ter sido agredida com tapas, chutes e golpes que causaram graves ferimentos na cabeça. Também teve de ficar nua em frente a dez soldados e trĂȘs agentes de repressão.
As entidades que representam os jornalistas estão preocupadas com uma possĂvel escalada de agressões no ano eleitoral. "HĂĄ um foco de ataque a jornalistas e imprensa por partidos e polĂticos da direita, que querem manter seus apoiadores na desinformação. Nós teremos uma guerra informacional e tememos pela segurança dos profissionais", alerta Maria José Braga.
ViolĂȘncia de gĂȘnero
Em março, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) divulgou estudo sobre violĂȘncia de gĂȘnero contra jornalistas, realizado com apoio do Global Media Defence Fund, da Unesco, em 2021. Segundo o levantamento, 127 mulheres jornalistas (cis e trans) e meios de comunicação foram alvos de 119 casos de violĂȘncia de gĂȘnero.
O relatório da Abraji monitorou redes sociais como propagadoras de agressões a profissionais de imprensa. Quase 60% dos casos de discursos estigmatizantes foram iniciados por publicações de autoridades de Estado e outras figuras proeminentes no campo polĂtico brasileiro. A maioria das vĂtimas eram jornalistas que cobriam polĂtica.
Em 2020, Bolsonaro foi criticado por entidades e chegou a ser processado após preferir um comentĂĄrio de cunho sexual a respeito da jornalista da Folha de S. Paulo PatrĂcia Campos Mello. Na ocasião, ele usou a palavra "furo" de forma pejorativa. "Ela [PatrĂcia] queria um furo. Ela queria dar um furo a qualquer preço contra mim", disse aos risos. No jargão jornalĂstico, "furo" é a informação publicada em primeira mão por um veĂculo ou profissional de imprensa.
Em outro episódio, o presidente disse a um jornalista que ele tem "uma cara de homossexual terrĂvel". A declaração foi dada depois que Bolsonaro foi questionado sobre o que faria se o senador FlĂĄvio Bolsonaro (PL-RJ), seu filho mais velho, estivesse envolvido em algum esquema de corrupção.
ViolĂȘncia fĂsica
A violĂȘncia fĂsica também faz parte do cotidiano dos profissionais de imprensa. Recentemente, dois repórteres foram agredidos por um homem com uma corrente de metal e um cachorro, durante a gravação de uma reportagem em São Paulo.
Em janeiro, durante uma gravação de reportagem, uma repórter foi agredida por um homem. Ele arrancou o microfone das mãos da profissional e pisoteou o equipamento. O caso também ocorreu em São Paulo.
JĂĄ no final do ano passado, na Bahia, equipes de reportagem foram agredidas por seguranças e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. Na ocasião, um dos profissionais levou um tapa no rosto. O chefe do Executivo chegou a pedir desculpas após o caso.
De acordo com a presidente da Fenaj, o combate à violĂȘncia contra jornalistas exige medidas de diversos atores, como o poder pĂșblico e a sociedade. "É preciso que as empregadoras assumam a responsabilidade pela segurança, pela integridade fĂsica e mental de seus profissionais. Obviamente o poder pĂșblico tem uma parcela a cumprir. É preciso que as instituições da RepĂșblica funcionem para a proteção dos profissionais. Que as polĂcias, o Ministério PĂșblico e o JudiciĂĄrio cumpram seus papeis", destacou.
"Esperamos que haja, também, comportamento da sociedade rechaçando a violĂȘncia e contribuindo para que os agressores não tenham nenhum tipo de respaldo em suas ações violentas", finalizou.