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Justiça nega recurso de madeireiro acusado de matar Paulino Guajajara e caso deve ir a júri popular

Um dos madeireiros acusados de assassinar Paulo Paulino Guajajara, liderança indígena e integrante do grupo Guardiões da Floresta, teve seu recurso negado pela Justiça e deve ir a júri popular.

Por Da Redação

25/10/2023 às 19:50:17 - Atualizado há

Um dos madeireiros acusados de assassinar Paulo Paulino Guajajara, liderança indígena e integrante do grupo Guardiões da Floresta, teve seu recurso negado pela Justiça e deve ir a júri popular. O assassinato aconteceu em 1º de novembro de 2019 na Terra Indígena (TI) Arariboia, localizada no sul do Maranhão e alvo contínuo de extração ilegal de madeira.

Nesta terça-feira (24), o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) foi unânime ao rechaçar os pedidos da defesa de Raimundo Nonato Ferreira e manteve a competência federal do caso, já que envolve conflito de terra e povos indígenas. "Estamos aliviados, é o que a gente mais queria", afirma Alicia Guajajara, irmã de Paulino.

Agora, a defesa do madeireiro pode ainda recorrer. Caso o possível recurso não seja acatado, o processo volta para a 1ª instância da seção judiciária em São Luís e, em seguida, será composto o júri popular que decidirá sobre a absolvição ou condenação de Nonato e do também madeireiro Antonio Wesly Nascimento Coelho.

Ambos são acusados por homicídio qualificado por motivo fútil em eventual emboscada, agravado por ofensiva contra a comunidade indígena. A data do júri popular ainda não foi definida pela Justiça Federal.

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"É muito devagar a justiça para Paulino. Muitos guardiões seguem morrendo e nada de justiça. Estão nos matando e ninguém faz nada. Então é muito bom que o júri vai acontecer. Se não tiver julgamento, nunca o branco vai parar de nos matar", avaliou José Maria Paulino Guajajara, pai de Lobo e líder espiritual de seu povo.

De acordo com o Relatório de Violência Contra os Povos Indígenas do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), nas duas últimas décadas 41 pessoas do povo Guajajara foram mortas. Destes assassinatos, 19 aconteceram dentro da TI Arariboia, que está homologada desde 1990. Só entre 3 de setembro de 2022 e 28 de janeiro de 2023, seis indígenas Guajajara foram mortos.

A família de Paulino, junto com integrantes da Associação Ka'aiwar dos Guardiões da Floresta, foi do Maranhão até Brasília acompanhar o julgamento e conversou com o Brasil de Fato da rodoviária, prestes a voltar para casa.


Parentes de Paulino Guajajara estiveram em Brasília acompanhando o julgamento / Maiara Dourado/Cimi

"Na aldeia, seguimos dormindo sem ter segurança. Os madeireiros nunca pararam de tirar estaca e tábua. Caçadores também nunca pararam. Estão com raiva de nós porque fazemos denúncias", relata José Maria, um dos importantes cantadores tradicionais dos Guajajara.

"E está muito ruim. Porque parece que matar indígena é como matar cachorro: não tem justiça. Se tiver justiça, como parece que vai ter agora, vai ser muito bom", opina.

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Assessora jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Carol Hilgert considera que o julgamento desta terça (24) foi "muito importante para o povo Guajajara". "É a primeira vez que veem a Justiça brasileira caminhando depois de pelo menos outros seis guardiões que foram mortos nos últimos anos. E é o primeiro caso que se vislumbra um desfecho".

Guardiões

Flay Guajajara acompanhou o julgamento a distância, de dentro da TI Arariboia. Como Paulino, ele integra o Guardiões da Floresta, grupo criado em 2012 para proteger o território de forma autônoma de madeireiros, grileiros e garimpeiros.

"Atualmente estamos fortalecendo nossa organização de monitoramento dentro do nosso território, diminuindo as entradas e invasões de caçadores e madeireiros. Esse é o nosso trabalho de mapeamento, levando as denúncias ao conhecimento das organizações competentes como Funai, Ministério Público e Ibama", explica Flay.

"A nossa luta hoje como guardião, como liderança, como comunidade é garantir o território para os nossos filhos, para os nossos netos, para o futuro", ressalta: "Então precisamos blindar nossa terra sem violência e sem invasão. É isso que queremos".

A emboscada que matou Paulino Guajajara

Aos 26 anos, Paulo Paulino Guajajara foi morto com um tiro no rosto quando voltava de um dia de caça com um amigo e também guardião, Laércio Guajajara, que conseguiu escapar ferido. Atingido no braço e nas costas, até hoje Laércio tem uma bala alojada na coluna.

Segundo o Ministério Público Federal (MPF), os indígenas apreenderam uma moto dos invasores de seu território, para denunciar às autoridades que havia presença ilegal dentro da reserva. Madeireiros teriam seguido os rastros do pneu, identificado que o veículo estava com Paulino e Laércio e disparado contra eles em uma emboscada.

Naquele 1º de novembro de 2019 uma comitiva indígena viajava pela Europa para denunciar as violações de direitos sob o governo Bolsonaro e o caso rapidamente ganhou repercussão internacional. Dois meses antes da emboscada, Paulino e outros três guardiões tinham entrado em um programa de proteção do Estado.

"Meu filho era um trabalhador. Ele dizia para mim 'pai, você já está velho. Eu não, agora quem trabalha sou eu'. E ele fazia as denúncias", conta José Maria. "Ali, num lugar que eu passei 10 anos pescando junto com ele, hoje é até perigoso a gente entrar, porque os caras estão lá. É perigoso para a gente andar dentro de partes do nosso próprio território", alerta.

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