Política CPMI do 8 de Janeiro

Walter Delgatti afirma que equipe de Bolsonaro propôs forjar a invasão de uma urna eletrônica um mês antes da eleição

Em depoimento à CPI dos Atos Golpistas, hacker disse que o próprio Jair Bolsonaro teria prometido indulto se tivesse problemas com a Justiça. A defesa do ex-presidente diz que vai apresentar queixa-crime contra Delgatti por crimes contra a honra.

Por Jornal Nacional

18/08/2023 às 12:13:15 - Atualizado há
Walter Delgatti prestou depoimento à CPI dos Atos Golpistas nesta quinta (17) - Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

A CPI dos Atos Golpistas ouviu nesta quinta-feira (17) o hacker Walter Delgatti, que foi preso por ter invadido o sistema da Justiça. Ele fez acusações a Jair Bolsonaro. Disse que o então presidente promoveu ações para divulgar informações falsas sobre as urnas eletrônicas. Delgatti não apresentou provas.

Walter Delgatti chegou à CPI com uma liminar do STF para ficar calado, mas afirmou que responderia às perguntas da CPI. Ele foi convocado porque passou a ser peça-chave nas investigações sobre a tentativa de fraudar as eleições de 2022.


Em 2019, o nome dele apareceu publicamente depois que Delgatti invadiu o celular de autoridades que atuavam na Operação Lava Jato. Voltou a ser preso em junho de 2022 por descumprir medidas cautelares - entre elas, a proibição de usar a internet.


Em depoimento à Polícia Federal, naquele momento, disse que tinha voltado a atuar na internet porque havia sido contratado para cuidar das redes sociais e do site da deputada Carla Zambelli, do PL.


Em julho, a Justiça autorizou que Delgatti respondesse ao processo em liberdade. Mas ele voltou a ser preso no início de agosto na operação da Polícia Federal que investiga a invasão de computadores do Poder Judiciário.


Delgatti afirmou à PF que, a mando de Zambelli, inseriu um falso mandado de prisão para o ministro Alexandre de Moraes, do STF - Supremo Tribunal Federal, no sistema do Conselho Nacional de Justiça e que recebeu R$ 40 mil da deputada e de assessores dela para tentar invadir sistemas do Judiciário.


Nesta quinta-feira (17), na CPI, Walter Delgatti disse que ainda em 2022 participou de uma reunião na sede do PL, a pedido de Zambelli, e que nessa reunião o marqueteiro do partido, Duda Lima, solicitou que ele produzisse um código falso para ser inserido em uma urna eletrônica emprestada. O objetivo era exibir de forma enganosa no dia 7 de setembro, um mês antes das eleições, uma propaganda de que as urnas poderiam ser violadas.


Delgatti: "Eles queriam que eu fizesse um código-fonte meu, não o oficial do TSE, e nesse código-fonte eu inserisse essas linhas que eles chamam de código malicioso, porque ele tem como finalidade enganar, como finalidade colocar dúvidas na eleição. Então, eu criaria um código meu, a ideia do Duda."

Eliziane Gama: "Ou seja, não seria um código-fonte?"

Delgatti: "Do TSE, não."

Eliziane Gama: "Seria alguma coisa manipulada, fake, sua."

Delgatti: "Exatamente, feita exatamente para mostrar... A ideia dele era a seguinte: era falar que a urna, se manipulada, sairia um outro resultado."


Delgatti confirmou à CPI o que já havia revelado em depoimento à Polícia Federal: que não conseguiu invadir o TSE, mesmo após diversas tentativas, pois o código fonte da urna eletrônica não fica hospedado em um computador com acesso à internet, mas fica em um computador offline, não sendo possível o acesso externo.


Walter Delgatti disse à CPI que teve um encontro no Palácio da Alvorada com o ex-presidente Bolsonaro, quando recebeu dele um pedido para tentar fraudar as urnas eletrônicas. Do Alvorada, por ordem de Bolsonaro, teria ido diretamente para o Ministério da Defesa.


Segundo Delgatti, a reunião com Jair Bolsonaro foi no dia 10 de agosto de 2022 e durou cerca de uma hora e meia. O encontro com Delgatti não constou da agenda oficial do ex-presidente.


"Sobre as urnas e sobre a eleição, e sobre a lisura das urnas. E a conversa foi bem técnica, até que o presidente me disse, falou assim: "Olha, a parte técnica eu não entendo, então, eu irei enviá-lo ao Ministério da Defesa e lá, com os técnicos, você explica tudo isso". A conversa se resumiu nisso. E também, ele pediu que eu fizesse o que o Duda havia dito sobre o dia 7 de setembro", disse Delgatti à CPI.


Delgatti afirmou que esteve cinco vezes no Ministério da Defesa; que se encontrou, inclusive, com o então ministro Paulo Sérgio Nogueira; e afirmou que o relatório do ministério sobre as urnas eletrônicas entregue ao Tribunal Superior Eleitoral no dia 9 de novembro de 2022 foi feito a partir de orientações dadas por ele.


"Eu posso dizer hoje que, de forma integral, aquele relatório tem exatamente o que eu disse, não tem nada menos e nada mais", afirmou o hacker.


Os questionamentos apresentados no relatório do Ministério da Defesa contrariam frontalmente as conclusões das demais entidades fiscalizadoras, como o Tribunal de Contas da União e a Ordem dos Advogados do Brasil, que atestaram que o processo eleitoral é seguro e imune a qualquer vício. A integridade do processo eleitoral brasileiro também foi atestada por inúmeros observadores internacionais.


Diante das declarações, a relatora da CPI, Eliziane Gama, do PSD, classificou o depoimento como bombástico.


"Presidente, eu quero finalizar e dizer que o depoimento de hoje é um depoimento muito importante para os trabalhos desta CPMI. Bombástico, como o senhor coloca. As informações que são trazidas a esta comissão são informações absolutamente sérias e são informações que estão em torno do ponto central desta CPMI, que é exatamente o questionamento do resultado eleitoral, a tentativa de emplacar uma vulnerabilidade e a busca de pessoas que já tinham histórico em relação à invasão, para que legitimasse, claramente, uma narrativa que é incompatível com a realidade em relação ao processo da segurança eleitoral", disse Eliziane Gama.


A reunião do dia 10 foi várias vezes abordada durante o depoimento. Os parlamentares queriam que o hacker desse mais informações sobre o que o ex-presidente pediu a ele.


Duarte Jr: "O senhor afirmou que teve contato, teve relação, tomou café da manhã, teve reuniões com o ex-presidente da República Jair Messias Bolsonaro e, nessa reunião, ele o contratou para fraudar a urna, para fraudar o processo eleitoral. O senhor pode me confirmar essa afirmação?"

Delgatti: "Sim, confirmo."


À tarde, o senador Flávio Bolsonaro, do PL, confirmou o encontro de Delgatti com o ex-presidente no Palácio da Alvorada. O próprio Jair Bolsonaro já tinha admitido a reunião.


"A conversa com o Seu Walter era exatamente para que ele demonstrasse os seus conhecimentos, para que fosse oficialmente instruído o TSE sobre possíveis vulnerabilidades das urnas eletrônicas. Foi só isso", disse Flávio Bolsonaro.


O hacker se recusou a responder às perguntas feitas por ele e outros parlamentares de oposição.


Delgatti também relatou uma outra conversa em que teria ouvido de Jair Bolsonaro que o ministro do STF - Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes tinha sido grampeado por estrangeiros. Segundo Delgatti, Bolsonaro pediu que ele assumisse a autoria do crime.


O hacker afirmou que não sabe se o grampo existe - e que não teve acesso qualquer material. A TV Globo apurou que não há nenhum indício de que o ministro Moraes tenha sido grampeado ilegalmente.


Indulto

Ao longo de toda a sessão, Walter Delgatti afirmou diversas vezes que o então presidente Jair Bolsonaro lhe prometeu um indulto no caso de ter problemas com a Justiça.


O hacker disse à CPI que a promessa de indulto partiu de Bolsonaro durante o encontro que tiveram no Palácio da Alvorada intermediado pela deputada Carla Zambelli. A fala de Delgatti à CPI ocorreu quando ele explicava aos parlamentares o plano de tentar atacar as urnas.


Eliziane Gama: "Você nesse momento colocou, por exemplo, a possibilidade de você ser punido, ser preso por isso? Você recebeu deles algum tipo de garantia de proteção?"

Walter Delgatti: "Sim, recebi e, inclusive, a ideia ali era que eu receberia um indulto do presidente. Ele havia concedido um indulto a um deputado, um deputado federal, e, como eu estava com o processo da Spoofing, à época, e com as cautelares que me proibiram de acessar a internet e trabalhar, eu visava a esse indulto, e foi oferecido no dia".


O deputado mencionado por Delgatti é Daniel Silveira, que teve o indulto anulado pelo STF - Supremo Tribunal Federal.


A promessa de perdão, segundo Delgatti, foi repetida em outra conversa que ele disse ter tido com Jair Bolsonaro, dessa vez por telefone - e também intermediada pela deputada Carla Zambelli. Segundo o hacker, Zambelli enviou um carro para buscá-lo em casa e, depois, a encontrou. Ele afirmou que, dentro do carro, ela enviou uma mensagem por celular e, logo depois, Bolsonaro ligou.


De acordo com Delgatti, Jair Bolsonaro pediu que o hacker assumisse a autoria do grampo que, supostamente, teriam conseguido nos telefones do ministro Alexandre de Moraes. Nesse momento, segundo Delgatti, Bolsonaro repetiu a oferta de perdão de pena em uma eventual condenação.


Delgatti: "E disse que, em troca, eu teria o prometido induto. E ele ainda disse assim: "Olha: se caso alguém te prender, eu mando prender o juiz". Ele usou essa frase."

Eliziane Gama: "Não, eu não entendi."

Delgatti: "Ele disse assim: "Fique tranquilo. Se acaso algum juiz te prender, eu mando prender o juiz". E deu risada."


Delgatti indicou o nome do ex-presidente como responsável direto ou indireto pelas ilegalidades que lhe foram propostas e repetiu que partiram sempre de Bolsonaro as promessas de indulto que o livrariam da prisão.


Pastor Henrique Vieira: "Quem pediu para o senhor tentar fraudar esse sistema?

Delgatti: "Carla Zambelli, por ordem do presidente Bolsonaro, do ex-presidente Bolsonaro."

Pastor Henrique Vieira: "Quem pediu para o senhor assumir a autoria de um suposto grampo contra o ministro Alexandre de Moraes?"

Delgatti: "O presidente Bolsonaro."

Pastor Henrique Vieira: "Quem te convidou para fazer propaganda eleitoral para sugerir ao povo uma suposta fraude no sistema eleitoral?"

Delgatti: "O marqueteiro Duda e também o presidente Bolsonaro."

Pastor Henrique Vieira: "Quem te encaminhou ao Ministério da Defesa para elaborar questionamentos ao TSE sobre o sistema de votação?"

Delgatti: "O então presidente Bolsonaro."

Pastor Henrique Vieira: "Quem te disse que, se o senhor cometesse um ilícito, seria perdoado e receberia um indulto?"

Delgatti: "O então presidente Bolsonaro."

Pastor Henrique Vieira: "Quem te deu carta branca para agir até mesmo na ilegalidade?"

Delgatti: "O então presidente Bolsonaro."


Em resposta a um questionamento do senador Veneziano Vital do Rego, do MDB, Walter Delgatti afirmou que aceitaria participar de uma eventual acareação com as pessoas que citou à CPI e que não se importaria de ficar frente a frente com o ex-presidente Bolsonaro para repetir tudo o que disse nesta quinta-feira (17). Ainda não houve votação de requerimento para esta acareação.


Diante das novas informações reveladas à CPI e que não haviam sido mencionadas na quarta-feira (16) em depoimento à Polícia Federal – como a proposta de indulto do suposto grampo de Alexandre de Moraes e da orientação que teria dado a servidores do Ministério da Defesa –, Walter Delgatti foi intimado a depor novamente nesta sexta-feira (18) à PF.


A relatora da CPI, senadora Eliziane Gama, do PSD, disse ver condições de pedir que Jair Bolsonaro seja indiciado.


"Eu diria que, hoje, os elementos apresentados a essa comissão nos dão fortes condições de ao final termos o indiciamento do ex-presidente Bolsonaro. Nós precisamos compatibilizar com as quebras que nós estamos defendendo que ocorra. Dentre elas, as quebras de sigilos, os relatórios do Coaf e as quebras telemáticas", disse.


O que dizem os citados

A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro classificou as declarações de Walter Delgatti como falsas e desprovidas de prova; afirmou que elas contêm, em tese, o crime de calúnia e que adotará as medidas judiciais cabíveis.


A defesa de Bolsonaro afirmou ainda que, no encontro no Alvorada, ele determinou ao Ministério da Defesa a apuração das alegações do hacker, de acordo com os procedimentos legais e em conformidade com os princípios republicanos, que fez isso na presença de testemunhas e que após esse encontro, Bolsonaro nunca mais manteve qualquer contato com Delgatti.


A defesa da deputada Carla Zambelli, do PL, voltou a dizer que ela rechaça qualquer acusação de conduta ilícita e imoral e disse que as declarações de Walter Delgatti são distorções, invenções e mentiras.


O marqueteiro do PL, Duda Lima, negou que tenha participado de reunião com Walter Delgatti e a deputada Carla Zambelli; disse que encontrou o hacker na sede do partido, mas que não sabia quem ele era nem quem estava com ele; e que, quando Delgatti se apresentou, desconversou e seguiu as atividades.


O ministro da defesa, José Múcio, declarou que pediu à Polícia Federal os nomes dos servidores militares e civis que receberam Delgatti no ministério em 2022 para a adoção das providências necessárias.


O Centro de Comunicação Social do Exército não quis se manifestar.


O Jornal Nacional não teve retorno do ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira.

Fonte: G1
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