Política Notícia

Retirada de pré-candidatura de Arthur do Val em SP impõe esforço extra para Moro

Por Da Redação

06/03/2022 às 14:47:11 - Atualizado há

Ao ver seu pré-candidato ao governo de São Paulo embarcar para a Ucrânia, Sérgio Moro apostou fichas de que a iniciativa de Arthur do Val o ajudaria a construir uma narrativa interessante para, ao mesmo tempo, contrapor críticas à “neutralidade” de Bolsonaro frente à guerra, e angariar um eleitorado mais jovem e conectado, identificado com o Movimento Brasil Livre (MBL). Menos de uma semana depois, no entanto, o ex-juiz e atual presidenciável se vê às voltas para resolver o fim do palanque que tinha no principal colégio eleitoral do país.

No sábado (5), após vazarem falas sexistas de Arthur do Val sobre mulheres ucranianas, o deputado estadual desistiu da pré-candidatura. São Paulo era, até o momento, o único estado onde o Podemos de Sérgio Moro tinha firmado um nome na disputa ao governo. Agora a sigla deposita a esperança na janela partidária para consolidar um novo nome. Políticos próximos à campanha avaliam em reserva que, mais do que nunca, caso o ex-juiz pretenda levar adiante o projeto presidencial, precisará entrar no jogo político e construir alianças partidárias da forma tradicional, isto é, com legendas.

A avaliação é compartilhada por analistas políticos.

Moro foi rápido em repudiar as declarações de Arthur do Val, mas preservou o MBL. “Sergio Moro precisa ter um palanque em São Paulo e ele não pode se dar ao luxo de romper uma aliança com o MBL porque senão fica órfão. Mas, apesar do MBL ter sido um ator estratégico no impeachment, acabou se perdendo de alguma forma, sobretudo no governo Bolsonaro”, observou o cientista político Leandro Gabiati, da Dominium Consultoria.

No início do ano, os principais líderes paulistas do MBL se filiaram ao Podemos em um ato comemorado por Moro. Na lista estavam o deputado federal Kim Kataguiri, o deputado estadual Arthur do Val, e o vereador pela capital Rubinho Nunes.

arthur do val mbl moro filiação podemosA aliança com Sergio Moro é parte de uma antiga busca do MBL para encontrar um nome na terceira via.arhtur do val mbl kim kataguriArthur do Val posa para foto na Ucrânia ao lado de coquetéis molotov e bombas caseiras Foto: Reprodução/Twitter

“Trouxemos o MBL para o Podemos e atraímos o apoio do Vem Pra Rua. A aglutinação da terceira via vai se dar entre um projeto e a sociedade civil. Isso está se dando em torno do meu projeto. O MBL tem uma comunidade enorme, uma comunidade jovem. Esses apoios, muitas vezes, são mais relevantes que os dos partidos políticos”, disse semanas depois o ex-juiz durante um evento para bancários.

Conhecido como Mamãe Falei, Arthur do Val era youtuber e conseguiu converter o engajamento das redes em votos. Em 2018 foi eleito como o segundo deputado mais votado da Assembleia Legislativa de São Paulo, angariando 470.606 votos. Já em 2020, candidatou-se à prefeitura da capital paulista e ficou em quinto lugar, com 9,74% dos votos.

Ex-bolsonarista, se construiu com discursos permeados de frases de efeito de combate à corrupção e críticas à política tradicional, tal qual a maioria dos integrantes do Movimento Brasil Livre e como o próprio Sérgio Moro.

Falta tradição partidária

Para a cientista política e professora da FGV/EPPG, Graziella Testa, essa proximidade do ex-juiz com o MBL traduz uma dificuldade de construção de uma agenda político-partidária. Na avaliação dela, a própria ligação de Moro com o Podemos é “frágil” e isso se deve a uma ausência de tradição política por parte do pré-candidato, algo que se reflete, inclusive na dificuldade de construir alianças com outros partidos.

O União Brasil foi uma das legendas com as quais Sérgio Moro manteve flertes, mas a ala mais tradicional do DEM – partido que se fundiu com o PSL para criar a nova sigla – barrou a continuidade das tratativas. Outras frentes foram abertas com o Cidadania, porém a cúpula do partido se posicionou contra uma federação com o Podemos, enquanto avançou nas conversas com o PSDB, do também presidenciável Joao Dória.

Na avaliação de Gabiati, o histórico de Sergio Moro e a insistência em unicamente uma agenda anticorrupção precisam ser observados de forma mais estratégica. “Essa agenda [anticorrupção] pode ganhar mais peso ao longo da campanha, mas há diferenças entre campanhas e nesta questão econômica, o acesso à saúde pública e outros são preocupações para o eleitorado. Então, nessa linha, o Moro vai ter que ser muito inteligente: caso se restrinja ao MBL e fique atrelado a esta questão, perde força e relevância”.

Essa dificuldade programática também foi observada por Graziella Testa, que destacou o fator “guerra na Ucrânia” como uma tentativa da equipe de Moro se de distanciar de Bolsonaro e construir uma nova agenda.

“Moro tem dificuldade de se localizar ideologicamente e programaticamente. Entender a ideologia de Moro é difícil, assim como qual o programa dele para o Brasil. Ele tem uma pauta clara por combate à corrupção, mas isso só não elege presidente. Então a guerra da Ucrânia era interessante porque era um momento em que se esperava um posicionamento de Bolsonaro que não aconteceu. Ter o apoio do MBL junto a essa pauta era uma chance de ele expandir para um público mais jovem, o que é outro nó na campanha. Parecia tudo bem, mas ao atuar de forma partidária e com apoio de outros grupos e outras pessoas, esse candidato acaba sofrendo as consequências de tudo o que a outra pessoa fala também”.

Tropeços do MBL

O Movimento Brasil Livre ganhou notoriedade nos protestos promovidos entre os anos de 2014 e 2016, que resultaram no impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). Nos anos seguintes, o MBL viu seus principais líderes enveredarem, com sucesso, para cargos políticos.

Postagem publicada por Sergio Moro em dezembro de 2021

Postagem publicada por Sergio Moro em março de 2022

Em 2018 o grupo apoiou a eleição de Jair Bolsonaro, rompendo após o primeiro ano de governo. Desde então o movimento trava batalhas internas para manter uma identidade coerente ante seu público, mas ao longo dos últimos meses protagonizou episódios que colocaram em xeque o movimento e a dimensão dele.

No ano passado, o MBL tentou repetir a articulação para protestos de rua e em setembro organizou atos contra o governo Bolsonaro, que, no entanto, tiveram uma baixa adesão. Números oficiais deram conta de seis mil pessoas na Avenida Paulista, em São Paulo, e menos de mil no ato na Esplanada dos Ministérios. Na ocasião, voltou a circular um vídeo no qual um dos dirigentes do movimento, Renan Santos, afirmava que se fosse impedido de entrar em um bar iria estuprar uma colega.

Renan participou da viagem à Ucrânia juntamente com Arthur do Val.

Este ano, novo episódio fez o movimento ter que dar explicações sobre falas controversas de um de seus integrantes.

Em entrevista ao Flow Podcast, em fevereiro, o deputado federal Kim Kataguri afirmou que “deveria existir um partido nazista legalizado no Brasil” e que “se o cara for anti-judeu ele tem direito de ser anti-judeu”. O parlamentar foi à público se desculpar, mas decidiu processar 17 pessoas que, de acordo com ele, o acusaram indevidamente de apologia ao nazismo.

“Eu tenho a impressão que o MBL não consegue se resolver de forma muito orgânica e quando tem uma perda de legitimidade externa, eles não têm para onde ir. O MBL está com essa dificuldade depois que o bolsonarismo começou a ter queda popular. Isso não é incomum, acontece com movimentos e com partidos, mas é um momento em que precisam mostrar qual a essência que faz eles estarem em conjunto”, comentou Graziella Testa.

Após o episódio envolvendo Arthur do Val, o Mamãe Falei, na volta da viagem à Ucrânia, o MBL divulgou uma nota na qual repudia as falas “machistas” do deputado e lamenta o “mal-estar que causamos às pessoas, especialmente mulheres, que se indignaram sinceramente com os áudios”. O texto termina com uma tentativa de se reafirmar politicamente e atribuir ataques a bolsonaristas ou lulistas.

“Aos aproveitadores, lulistas e bolsonaristas, que viram nessa ocasião apenas um motivo para nos atacar, devemos reiterar que nada impedirá o MBL de continuar com seu trabalho em prol da terceira via, de uma alternativa aos projetos políticos criminosos do PT e do Bolsonaro”, conclui a nota. O texto foi divulgado nas redes sociais Instagram e Twitter, mas ao contrário de outras postagens, a opção de comentários estava desativada em ambas.

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