Política ciência

Pobreza: Na natureza, não

Por Da Redação

03/01/2022 às 19:46:48 - Atualizado há

Por Ricardo Prado Pires de Campos*

Por quais razões ainda existe pobreza se a natureza é tão rica?

Nossas necessidades não são apenas materiais, mas também imateriais, consumimos bens etéreos como cultura, conhecimento (educação), saúde (mescla de bens materiais e imateriais), e até bens dito espirituais como religião, paz (meditação, contemplação) e outras crenças.

Ainda assim, temos uma grande parcela da população desprovida do básico, seja de bens materiais, seja em cultura.

Na época das Monarquias Absolutistas, em pleno século XVIII, Rousseau vinculou à riqueza a propriedade das terras. Num mundo predominantemente agrário, isso fazia sentido.

Com o advento da Revolução Industrial, a riqueza passou a ser gerada nas fábricas, e Marx apoiou seu teoria econômica na ideia de que a riqueza estava na posse dos meios de produção. Não se restringia apenas às terras, mas também às fábricas.

Na atualidade, na dita sociedade do conhecimento, a riqueza já não depende mais da propriedade das terras ou da posse de máquinas e equipamentos que integram as fábricas. A riqueza depende do conhecimento.

Muita gente não enxerga valor no conhecimento; mas a prova mais cabal dessa nova realidade é que as maiores empresas em valor de mercado, no mundo, são as empresas voltadas à comunicação e ao comércio eletrônico: Apple, Google, Microsoft e Amazon, possuem valor de mercado na ordem de trilhão de dólares.

Valem muito mais que as terras e os castelos dos Reis, valem mais que as fiações, tecelagens e siderúrgicas da época industrial, e estão hoje nos aplicativos ou celulares nas mãos dos consumidores do mundo inteiro (ou quase, mas a caminho).

Esses smartphones, ou celulares inteligentes, estão democratizando o acesso às informações, são máquinas que levam às pessoas a possibilidade de gerarem riqueza suficiente para bancarem suas vidas.

Com o celular, o meio de produção passa a estar acessível a todas as pessoas. Todavia, não basta o acesso à máquina, é preciso dominar a tecnologia. É preciso o conhecimento sem o qual a máquina não funciona.

A riqueza não é apenas material, e seu processo de criação não envolve apenas aspectos físicos, materiais, de execução, mas igualmente aspectos mentais, culturais, de domínio do sistema, de aprendizado da técnica, sem o que nada funciona.

Portanto, sem investimento na formação da mão de obra, sem investimento em ciência e na cultura da população, o país não aumentará sua produção de riqueza.

Temos milhões de pessoas sem acesso à cultura, a educação de qualidade, e portanto, condenadas a um baixo nível de produtividade.

Com um celular em mãos e acesso a internet, o cidadão pode aprender. Mas sem um mentor, um professor, um instrutor, isso se torna tarefa de difícil realização. Autodidatas existem, mas em geral, só se formam a partir de um nível básico elevado. Depois de certo patamar de conhecimento, é possível evoluir sem um tutor, basta a comunicação com outros pesquisadores. O conhecimento evolui a partir da interconexão de saberes gerados em diferentes pontos do globo. Para interconectá-los é preciso criar novos neurônios que façam a ligação; novos fios. Novas pontes precisam ser construídas, mas isso exige alguns pressupostos, alguns conhecimentos previamente adquiridos.

Talento não é dom, não é dado como muitos acreditam. Talento é desenvolvido, criado com muito estudo e trabalho. Exige apropriar-se das ferramentas certas e aprender a manuseá-las com esmero. Sejam pregos e martelos, sejam tratores, arados e colheitadeiras, ou palavras, câmeras ou imagens, tudo tem de ser aprendido, desenvolvido.

O conhecimento não cai do céu, é preciso ir buscar. Como diz o professor Mário Sérgio Cortella: “Vaca não dá leite, tem de tirar”. Tem de fazer, executar. Mas só consegue executar quem conhece, quem domina as ferramentas e a tecnologia (saber como usar). Do contrário, nada irá acontecer.

Portanto, ciência, cultura e educação são fundamentais.

O primeiro e único candidato a presidente da República que defendeu a educação como solução para os problemas nacionais foi o finado Leonel Brizola (1922-2004), ex-governador do Rio Grande do Sul (1959-63) e do Rio de Janeiro (1983-87 e 1990-94). Defensor e construtor das primeiras escolas em período integral: os CIEPs – Centros Integrados de Educação Pública (os “Brizolões”).

Como a educação não é vista como prioridade nacional (Brizola não foi eleito presidente), nós seguimos patinando no crescimento econômico.

Sem ciência, sem cultura, sem valorização dos pesquisadores e professores, sem transformar as escolas em objeto do desejo dos brasileiros, não teremos riqueza para todos.

Com milhões de excluídos dos bancos escolares, sem infraestrutura adequada nas escolas e sem aperfeiçoamento da mão de obra, o país continuará com parte significativa de sua população vinculada ao atraso, a fome e a ignorância.

As ilhas de saber e prosperidade existem no país, e estão em ampliação, mas a passos acanhados. Muitas empresas (como Embraer, WEG e outras) e universidades são modelos de excelência, mas precisam ser mais valorizadas, serem transformadas em celeiros de pensadores e pesquisadores que sejam o fermento do país.

Precisamos valorizar e investir mais em ciência, educação e cultura; ao contrário do caminho trilhado pela atual administração.

Esperemos e trabalhemos para que os próximos gestores públicos tenham maior conhecimento e melhor visão sobre o processo de criação e distribuição da riqueza e não fiquem apegados a dogmas do século XVI como desmatamento e mineração em terras indígenas.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

(Constituição Federal)

Ricardo Prado Pires de Campos é professor e mestre em Direito das Relações Sociais, com ênfase em Processo Penal, foi promotor e procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo, e atualmente preside o MPD – Movimento do Ministério Público Democrático, associação de membros do Ministério Público brasileiro.

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