BRASÍLIA – Celebrada até os dias atuais como um texto moderno e construído depois de amplo debate, a Constituição Federal (CF) chegou aos 33 anos de existência e resistência nesta terça-feira, 5. Na opinião de quem tem a oportunidade e privilégio de acompanhar de perto o trabalho dos Constituintes, a Carta Magna marcou uma época e trouxe a esperança do surgimento de um novo Brasil a partir da sua promulgação.
O advogado e professor universitário Helso do Carmo Ribeiro acompanhou bem de perto este período da história e conta que a Assembleia Constituinte foi heterogênea, num Congresso Nacional diversificado que atendia, pelo menos um pouco, os anseios da população. Ele lembra de um fato marcante, principalmente para a política amazonense. “Tivemos três representantes mulheres no Congresso Nacional participando do processo de elaboração da nova Constituição Federal: Beth Azize, Sadie Hauache e Eunice Michiles”.
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Na avaliação dele, das sete Constituições que o Brasil já teve, a de 1988 é a mais avançada e democrática, com princípios e valores adotados por todas as sociedades contemporâneas. “Até pelo momento em que ela foi elaborada, ainda vivíamos o Governo Sarney, recém-saídos de uma ditadura militar, então o texto Constitucional acabou ficando bem analítico e entrando em alguns aspectos que não são tratados por constituições de outros países, como, por exemplo, as questões ambientais”, destaca o também cientista político.
A questão indígena também foi contemplada na Lei Maior brasileira. “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. determina o Artigo 231, que tem sido, constantemente, citado e relembrado durante as mobilizações de povos indígenas em todo o Brasil.
Uma curiosidade em relação à Constituição Federal é de que mesmo garantindo a manutenção do Sistema de Governo presidencialista, uma ferramenta do parlamentarismo ficou no texto da Carta Magna: as medidas provisórias. Isso aconteceu, conforme relata Helso Ribeiro, graças à articulação do “centrão”, que apoiava o presidente José Sarney, barriu a ideia de implantação do sistema parlamentarista no Brasil.
O trabalho de elaboração da nova Constituição e a posterior promulgação traziam a esperança de que o País mudaria a partir daquele dia 5 de outubro de 1988. Hoje, o professor Helso sempre convida os alunos a uma reflexão. “Não é através de leis que a nossa felicidade virá, ela virá com o exercício da cidadania, com todos nós passando a nos interessar por assuntos da política, fiscalizando aquelas pessoas que escolhemos para nos representar”, pontuou ainda.
A pedagoga Meiry Rattes defende, à CENARIUM, a inclusão do estudo da Constituição Federal nos bancos escolares usando um viés interdisciplinar. “A Constituição Federal é importante para os cidadãos, logo, poderia ser adaptada para os níveis de ensino de educação básica”, afirmou.
Outra educadora, a diretora da Rede Pedagógica, Erika Radespiel, afirma que o conhecimento da Constituição Federal é condição para o exercício da cidadania – um dos objetivos da Educação. Ela também concorda com um trabalho inter e transdisciplinar que apresente a Constituição nas escolas e universidades. “É importante que todo cidadão conheça as Leis que regem o seu País. As crianças, bem como os jovens e adultos devem ter ciência e consciência dos seus direitos e deveres”, destacou.
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Erika acredita que é importante, no incentivo deste conhecimento, desmistificar a ideia de que a Lei é algo difícil de se compreender, acessível apenas por profissionais especializados no assunto. “A Constituição Federal, bem como toda e qualquer norma, diz respeito à vida, ao cotidiano, questões que fazem parte da sociedade. Todo mundo pode compreender o teor de capítulos e artigos da CF desde que esse conteúdo seja apresentado em linguagem condizente com a faixa etária”, contribuiu ainda.
O relator da Constituição de 1988, jurista Bernardo Cabral, gravou uma mensagem endereçada aos membros da Academia de Ciências e Letras Jurídicas do Amazonas, relembrando os 33 anos de promulgação da CF. No vídeo, ele falou sobre as críticas recebidas durante os trabalhos constituintes, quando políticos diziam que a Constituição “não duraria seis meses”. Nas palavras de Cabral, as crises que o País está passando, “só não levaram o Brasil a uma ditadura porque a nossa Constituição está aí: 33 anos de resistência”.