SaĂșde Narcolepsia

Conheça a síndrome que provoca sono involuntário durante o trabalho e outras atividades

Por Isto É

26/12/2023 às 08:28:03 - Atualizado hĂĄ
Foto: Reprodução internet

Existe uma sĂ­ndrome rara que provoca sono involuntĂĄrio durante o trabalho e outras situações que podem ser perigosas como, por exemplo, quando a pessoa estĂĄ dirigindo. Esse distĂșrbio neurológico, chamado de narcolepsia, pode afetar as atividades do dia a dia por conta da vontade excessiva de dormir em qualquer hora ou lugar. A doença também paralisa o paciente durante o repouso e pode provocar alucinações durante o sono, como a pessoa sentir que estĂĄ sonhando acordada, além de episódios temporĂĄrios de fraqueza muscular (cataplexia).

Os ataques de sono podem ocorrer diversas vezes durante o dia, sem o controle do indivĂ­duo. Quem sofre com narcolepsia pode adormecer involuntariamente mesmo que esteja conversando, dançando, comendo ou até mesmo dirigindo. Com frequĂȘncia, após esses cochilos — que podem durar de dez minutos a mais de uma hora — os pacientes sentem-se mais descansados.

O estudante de medicina Vitor Dmetruk Carvalho, 21 anos, sabe das dificuldades de viver com narcolepsia. Ele foi diagnosticado aos 15 anos e conta que sofreu bullying durante todo o ensino médio. "Perdi vĂĄrias matérias e provas, mas o pior era não ter a compreensão dos colegas de turma, que sempre faziam brincadeiras de mau gosto comigo", lembra.

Suas crises acontecem nas mais diversas situações, sejam elas monótonas (quando o sono aparece com mais frequĂȘncia e intensidade) ou em atividades corriqueiras, como estudar, comer e praticar atividades fĂ­sicas. O estudante diz que o sono profundo acontece até mesmo em momentos alegres e prazerosos.

"JĂĄ deixei de fazer a prova de vestibular, dormi diversas vezes na aula e nas provas, na academia e enquanto tocava bateria. Quando o sono vem, tenho que deitar atrĂĄs da bateria e tirar um cochilo por alguns minutos. Não consigo evitar. Antes de receber o diagnóstico, cheguei a sentir sono durante o passeio a um parque temĂĄtico. Isso sem falar quando estou andando de ônibus e até de bicicleta. Quando isso aconteceu, tive que parar de pedalar, sentar em algum banco e esperar o perĂ­odo de sonolĂȘncia terminar", revela.

Após o diagnóstico, os pais de Carvalho receberam orientações sobre os cuidados com a rotina e a higiene do sono – um conjunto de prĂĄticas que devem ser seguidas antes de dormir, com o objetivo de facilitar o inĂ­cio do sono – a fim de reduzir os episódios de sonolĂȘncia durante o dia. Apesar desses cuidados e do uso da medicação indicada pelos médicos, o estudante ainda enfrenta crises durante o dia, com uma média de trĂȘs episódios, cada um com duração de pelo menos 30 minutos.

O que causa a narcolepsia?

A ciĂȘncia ainda não conhece o mecanismo que leva ao desenvolvimento de todos os casos de narcolepsia. Contudo, evidĂȘncias consistentes sugerem que pessoas com predisposição genética, quando expostos a algum gatilho ambiental (como infecção ou vacinação, por exemplo), ativam o sistema imunológico, desenvolvendo células de defesa contra um grupo de neurônios especĂ­ficos de uma região cerebral conhecida como hipotĂĄlamo lateral.

"Esses neurônios são responsĂĄveis pela produção da hipocretina, substância que promove o despertar e mantém a estabilidade das fases do sono. Com a queda da hipocretina, os indivĂ­duos ficam susceptĂ­veis a uma maior sonolĂȘncia e instabilidade no decorrer do sono, sobretudo do perĂ­odo do sono REM (sigla em inglĂȘs para movimento rĂĄpido dos olhos, que é a fase mais profunda do sono)", explica o neurologista LĂșcio Huebra, que é mestre em Psicobiologia (Medicina do Sono) e professor do curso de Medicina do Centro UniversitĂĄrio São Camilo, além de membro titular da Academia Brasileira de Neurologia, da Associação Brasileira de Sono e da European Sleep Research Society.

"Além disso, algumas lesões cerebrais, como encefalites ou esclerose mĂșltipla, também podem causar narcolepsia", complementa o neurologista e neurofisiologista clĂ­nico Leonardo Ierardi Goulart, especialista em medicina do sono e médico do corpo clĂ­nico do Hospital Israelita Albert Einstein.

Mais comum entre os jovens

O surgimento dos primeiros sintomas, como sonolĂȘncia excessiva, alucinações ao adormecer ou acordar, e paralisia do sono, é mais comum entre os jovens, apresentando dois picos de incidĂȘncia, por volta dos 15 anos e, posteriormente, dos 35 anos. As estimativas globais indicam uma prevalĂȘncia variĂĄvel de 0,1 a 17 pessoas para cada 100 mil habitantes. No Brasil, observa-se uma prevalĂȘncia intermediĂĄria, mas ainda não hĂĄ dados concretos disponĂ­veis. Segundo especialistas entrevistados pela AgĂȘncia Einstein, não existem diferenciações étnicas significativas, embora haja uma leve tendĂȘncia de o problema ser mais comum em homens.

No Brasil, não existe uma legislação especĂ­fica que oriente em relação ao risco de acidentes de trânsito ou de trabalho em indivĂ­duos com narcolepsia. A decisão sobre os riscos de acidentes em situações de perigo, especialmente relacionados à direção de veĂ­culos, cabe ao médico, em conjunto com o paciente. Em alguns paĂ­ses, é realizado um teste para avaliar a capacidade da pessoa de se manter acordada (teste de manutenção da vigĂ­lia) antes da liberação da permissão para condução.

Medidas comportamentais tĂȘm papel fundamental no tratamento

A narcolepsia não tem cura. O tratamento visa exclusivamente controlar os sintomas, como a sonolĂȘncia excessiva durante o dia. Para isso, são prescritos medicamentos estimulantes de uso controlado, que promovem um maior estado de alerta. No caso de outros sintomas, é necessĂĄrio combinar o uso de medicamentos da classe dos antidepressivos — a prescrição não se baseia no efeito desses medicamentos no humor, mas sim em seu impacto direto no sono, evitando a ocorrĂȘncia desses fenômenos.

"Infelizmente, o tratamento completo disponĂ­vel no Brasil não é disponibilizado pelo Sistema Único de SaĂșde (SUS) ou por convĂȘnios médicos. Apenas alguns dos antidepressivos usados no tratamento da cataplexia são distribuĂ­dos gratuitamente. As medicações são de alto custo, o que dificulta o tratamento adequado no paĂ­s, especialmente nas doses necessĂĄrias para um adequado manejo", ressalta o neurologista Huebra.

Os especialistas destacam que algumas medidas comportamentais tĂȘm papel fundamental dentro do tratamento, como cultivar uma boa higiene do sono, procurar não dormir tarde e evitar o uso de telas à noite, além de tirar cochilos curtos programados e distribuĂ­dos ao longo do dia para evitar adormecer em situações inapropriadas.

Ao longo da evolução do distĂșrbio, é comum o indivĂ­duo apresentar outros sintomas associados, como ganho de peso e/ou obesidade, desenvolvimento de apneia do sono, transtornos psiquiĂĄtricos – principalmente depressão e ansiedade – e aumento do risco cardiovascular.

Huebra ressalta, ainda, que existem benefĂ­cios de acompanhamento com uma equipe multidisciplinar, incluindo educador fĂ­sico, nutricionista e psicólogo, visando a melhora de outras medidas comportamentais, como a prĂĄtica de atividade fĂ­sica aeróbica, o controle de peso, e de sintomas depressivos e ansiosos.

"A cafeĂ­na, por exemplo, é um estimulante de amplo acesso que pode ser usado em casos de sonolĂȘncia diurna, porém, como na narcolepsia hĂĄ uma tendĂȘncia de sono noturno fragmentado, é recomendado a redução do consumo no perĂ­odo noturno, sobretudo próximo ao horĂĄrio de dormir", pontua o médico.

Pacientes em tratamento apresentam uma melhora de qualidade de vida com atenuação dos sintomas, porém uma remissão completa das queixas é geralmente difĂ­cil, mesmo com o tratamento otimizado.

"Algumas limitações podem persistir, como a tendĂȘncia de adormecer em atividades monótonas e pouco ativas, risco de acidentes por cataplexia, necessidade de cochilos programados em intervalos de trabalho ou estudo", adverte Goulart.

O estudante de medicina diz que mesmo em tratamento e tendo aprendido a lidar com a sĂ­ndrome, ainda tem muitas crises de sono de dia. "Isso me deixa abalado de certa forma. Essa rotina afeta, principalmente, os meus estudos e as relações sociais. E depois de cada crise de sono durante o dia fico muito triste. Quanto mais crises de sono eu tenho, mais triste fico. É um ciclo que se retroalimenta sempre", conta Vitor Dmetruk Carvalho, que faz consultas de rotina no Hospital das ClĂ­nicas de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), com uma equipe médica formada por um neurologista, um médico do sono e um psiquiatra.

Atualmente, ele convive com professores e colegas de faculdade que compreendem a situação e o ajudam na rotina de estudos. "Consegui me cercar de mais pessoas que entendem e demonstram empatia em relação às minhas dificuldades e necessidades. Essa rede de apoio faz muita diferença na minha vida", assegura o estudante de medicina.

Fonte: AgĂȘncia Einstein

Fonte: Isto É
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