Litoral manguezais

As surpresas da pesquisa em manguezais, pântanos surpreendentes que assustam e encantam

Caranguejo mutante, parasita "alien", "areia movediça", gavião-caranguejeiro, mão-pelada são algumas curiosidades encontradas por pesquisadores Manguezais são abrigos para diversas espécies de fauna e flora bem peculiares | foto: Gabriel Marchi.

Por Da Redação

27/07/2023 às 04:46:35 - Atualizado há

Caranguejo mutante, parasita "alien", "areia movediça", gavião-caranguejeiro, mão-pelada são algumas curiosidades encontradas por pesquisadores

Manguezais são abrigos para diversas espécies de fauna e flora bem peculiares | foto: Gabriel Marchi.

Em filmes um pouco mais antigos eram comuns cenas de ação envolvendo as temidas areias movediças. Mocinhos e vilões ficavam presos no solo mole e, quanto mais se mexiam, mais afundavam. No litoral brasileiro, pesquisadores do Programa Rebimar, patrocinado pela Petrobras e pelo Governo Federal, enfrentam desafios parecidos nos manguezais. Para chegar em alguns pontos, eles precisam literalmente evitar serem engolidos junto com os equipamentos.

Não é difícil atolar até ficar complemente impossível se mover. O jornalista e documentarista do Rebimar Gabriel Marchi já atolou algumas vezes com o equipamento pesado. "Só não atola quem nunca foi. Eu afundei até a cintura. Foi desesperador", conta ele.

A bióloga Cassiana Baptista Metri conta que em locais onde há coleta de caranguejos e manguezais mais próximos a comunidades, um dos lixos mais comuns são sapatos e solas de sapato. "Descola mesmo. A lama é tão pegajosa que se o calçado não for apropriado você fica descalço nos primeiros minutos, não tenha a menor dúvida."

O desembarque é uma amostra do que os pesquisadores enfrentam. Imagem: Cassiana Baptista Metri.

Em outros cantos do país as "areias movediças" também desafiam a persistência dos cientistas. Janaina Oliveira coordena o Projeto UÇÁ, outra iniciativa patrocinada pela Petrobras e pelo Governo Federal. A bióloga marinha lembra de quando começou a atuação no manguezal, no Rio de Janeiro, e hoje ri da situação. "Em uma das minhas primeiras vezes em campo, em 2013, eu atolei e fiquei presa. A equipe continuou fazendo o trabalho e eu fiquei lá parada esperando. Na volta, o pessoal retornou para me salvar", recorda.

A fauna do manguezal guarda outros mistérios assustadores. Um deles foi um caranguejo zumbi, encontrado durante um dia de pesquisa. "Ele estava completamente oco por dentro, como um morto-vivo. O catador pegou na nossa frente. Ele estava vivo, se mexendo e tudo mais", relata Cassiana Baptista Metri. 

Outro caranguejo encontrado pela equipe estava sendo devorado vivo por outro animal, que lembra muito a aparência dos aliens em filmes de ficção. "Encontramos esse parasita grande que parece um alienígena, branquinho, dentro do caranguejo. Mas encontrei um só, o que é positivo, indica que os bichos não estão tão parasitados. A espécie é um risópode, parente do tatuzinho de jardim. Consegui filmá-lo ainda vivo, quando o retiramos de dentro do caranguejo".

Outra surpresa foi trazida por um aluno, um caranguejo que tem uma das patas da frente com três dedos. "A família do estudante estava toda reunida para a refeição e os caranguejos já estavam cozidos. Foi quando alguém falou que queria aquele de três dedos. Por sorte, nosso aluno resgatou o bicho da mesa e hoje o exemplar raro está na faculdade. É nossa estrela. Sempre levamos para as exposições. Foi o único assim encontrado por aqui, até agora", conta Metri. 

Parasita encontrado vivo dentro de caranguejo | Imagem Cassiana Baptista Metri

O caranguejo é uma iguaria que atrai diversas espécies curiosas de predadores. Em uma das frentes, o Projeto Uça, monitora o retorno da fauna em áreas restauradas pelo programa. "Colocamos câmeras em alguns pontos e conseguimos registros do mão-pelada, um mamífero que se alimenta do caranguejo. Ele tem esse nome porque não tem pelos nas patas", explica Janaina. 

Caranguejo de três dedos encontrado por estudante da Unespar | foto: Anne Carolina Sandi.

Os pesquisadores, acostumados em ver a dificuldade dos catadores no mangue, se perguntam como o bichinho de braços tão curtos consegue capturar os caranguejos nas tocas. Um enigma que logo deve ser desvendado pelas armadilhas fotográficas do projeto.

Mão-pelada em ação! Câmeras registram animal caçando caranguejos no manguezal | foto: Projeto Uça

E não é só do solo vem o perigo para os caranguejos. Outro predador voraz é o gavião-caranguejeiro, uma águia rara que só vive em áreas de manguezal. O melhor lugar no planeta para observação é na Estação Ecológica de Guaraqueçaba, área de atuação do REBIMAR. Isso atrai um grande número de observadores de aves do mundo inteiro. 

"Quando a maré baixa, o gavião-caranguejeiro aproveita para caçar. Com o bico forte, consegue quebrar com facilidade a dura carcaça do caranguejo-uçá e outros crustáceos. Ele tem entre 42 a 46 centímetros. Pode ser avistado o ano inteiro, mas no período reprodutivo fica mais ativo, o que facilita a observação", orienta o guia e ornitólogo Raphael Sobania. 

Outra ave surpreendente que depende dos manguezais é o Guará. A alimentação baseada em pequenos caranguejos torna a cor dessa ave impactante. O vermelho vivo parece saltar na paisagem verde do manguezal. A espécie chegou a ficar extinta no Paraná por cerca de 80 anos e os bandos retornaram ao litoral em 2008. "Ainda é um mistério o retorno dos Guarás ao estado. Uma hipótese é que seja um excedente de população de Cubatão, em São Paulo", avalia Sobania. 

A volta dos Guarás ao litoral paranaense, depois de 80 anos, ainda é um mistério para pesquisadores | foto: Gabriel Marchi.

O Programa Rebimar é um conjunto de ações socioambientais voltadas para a conservação da região litorânea, principalmente no Paraná e na costa sul de São Paulo. A iniciativa faz parte da Associação MarBrasil, tem patrocínio da Petrobras e do Governo Federal, e conta com apoio científico do Centro de Estudos do Mar da Universidade Federal do Paraná e do Instituto Federal do Paraná.

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