PolĂ­tica

TJ-SP deve decidir nesta quarta se mantém afastamento de juiz filmado enquanto agredia e humilhava a mulher

Por G1

12/04/2023 às 06:00:36 - Atualizado hĂĄ
Decisão serĂĄ do Órgão Especial, que reĂșne 25 desembargadores do tribunal. Na semana passada, corregedor afastou provisoriamente o juiz Valmir Maurici JĂșnior, da 5ÂȘ Vara CĂ­vel de Guarulhos. A defesa do magistrado nega "veementemente os fatos que lhe são imputados". Caso foi revelado pelo g1. Mulher obtém medida protetiva após acusar juiz de violĂȘncia fĂ­sica, sexual e psicológica

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo deve decidir nesta quarta-feira (12) se mantém o afastamento do juiz Valmir Maurici JĂșnior, da 5ÂȘ Vara CĂ­vel de Guarulhos, na Grande São Paulo, que aparece em vĂ­deos agredindo e humilhando a mulher.

O caso foi revelado pelo g1, que obteve vĂ­deos que mostram as agressões, ocorridas na casa em que os dois moravam, em Caraguatatuba, no Litoral Norte de SP (veja trechos acima). A mulher o acusa de violĂȘncia fĂ­sica, sexual e psicológica.

O juiz estĂĄ afastado do cargo desde 3 de abril, por determinação do desembargador Fernando Antonio Torres Garcia, corregedor do TJ. Na ocasião, Garcia sinalizou que a decisão, provisória, seria submetida ao Órgão Especial, colegiado formado por 25 desembargadores. A sessão do Órgão Especial desta quarta começarĂĄ às 13h30.

Na terça (11), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) abriu processo administrativo-disciplinar para apurar a conduta do juiz e, por unanimidade, também decidiu afastĂĄ-lo do cargo. Os procedimentos que correm no TJ e no CNJ são autônomos, sem relação entre si.

Em um dos vĂ­deos obtidos pelo g1, o juiz dĂĄ um tapa na cabeça da esposa; em outro, ele dĂĄ empurrões, chute e a xinga, e ela cai no chão; ambos foram gravados com um celular dela — segundo ela, em outubro de 2022. Em um terceiro vĂ­deo, de abril de 2022, aparentemente gravado pelo próprio juiz, ele a submete a uma relação sexual — segundo ela, não consentida por não ter tido opção de escolha.

CNJ vai analisar afastamento de juiz filmado enquanto agredia mulher

A vĂ­tima e Maurici JĂșnior se casaram em 2021. A mulher, de 30 anos, diz que saiu de casa em 23 de novembro; o casal estĂĄ em processo de separação. A violĂȘncia começou depois dos seis primeiros meses de relação, segundo a defesa dela.

Em janeiro, ela obteve medida protetiva na Justiça, com base na lei Maria da Penha, que proĂ­be o juiz de se aproximar e de manter contato com a mulher e com pais e familiares dela. Na mesma decisão, Maurici JĂșnior, 42 anos, também foi obrigado a entregar a arma a que tem direito por ser magistrado.

O Ministério PĂșblico de São Paulo abriu investigação sobre o caso.

O g1 apurou que o MP trata "os fatos noticiados" como "gravĂ­ssimos" e que o juiz "demonstrou comportamento violento, manipulador, desviado, e que potencialmente colocaria em risco" a integridade da vĂ­tima e dos seus parentes. No mesmo parecer, o MP trata a mulher como "vĂ­tima" e o juiz, como "investigado".

O procedimento estĂĄ no Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, órgão responsĂĄvel por casos do tipo de acordo com a Lei Orgânica da Magistratura.

A defesa do juiz nega "veementemente os fatos que lhe são imputados". Na terça (11), os advogados Marcelo Knopfelmacher e Felipe Locke Cavalcanti informaram que tĂȘm "plena confiança na Justiça e no restabelecimento da verdade uma vez instalado o contraditório e exercido o direito de defesa em sua plenitude." (veja resposta na Ă­ntegra mais abaixo).

Em entrevista ao repórter Giovani Grizotti no dia 27 de dezembro, a vĂ­tima conta que conheceu o juiz em outubro de 2020, quando, segundo ela, ele vivia em Santa Catarina e ela, no interior de São Paulo. Em dezembro de 2021 ela se mudou para Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo, para morar com Maurici JĂșnior.

"Eu conheci ele quando ele me mandou uma mensagem pelas redes sociais e me convidou para jantar. Na época, ele morava em Santa Catarina. Eu ficava muito com ele em Santa Catarina. E ele era uma pessoa encantadora. Parecia um prĂ­ncipe (...) eu fiquei muito apaixonada", disse.

A relação dos dois, conta, começou a ficar violenta aos poucos, e ela não queria o fim da relação:

"Ele sempre falou do sexo com força, mas eu não entendia o que era isso. Eu sofri todo tipo de violĂȘncia com ele. ViolĂȘncia sexual, moral, fĂ­sica, psicológica. Ele usava de vĂĄrios mecanismos para me deixar confusa. Ele falava: é só dar um tapa. Eu consegui perceber que saiu do contexto sexual quando eu tava na cozinha, fazendo alguma coisa, ele me dava um tapa na cara, puxava meu cabelo", afirmou.

Registros no cofre

Ela afirma que não tinha provas da violĂȘncia. Foi então que ela colocou o celular no quarto, na direção da cama, para tentar flagrar agressões. A mulher conseguiu filmar um tapa dado nela pelo juiz enquanto os dois estavam deitados na cama. Também registrou xingamentos e empurrões, quando ela estava na frente dele perto da porta do quarto. Ambos os registros são de 2 de outubro de 2022, de acordo com ela (veja no vĂ­deo acima).

Ao sair de casa, ela levou consigo um cofre que, segundo ela, Maurici JĂșnior mantinha no escritório da casa. Dentro, havia, entre outros arquivos, um vĂ­deo aparentemente filmado pelo próprio juiz. Segundo a vĂ­tima, o vĂ­deo foi gravado em 10 de abril de 2022.

O g1 teve acesso ao vĂ­deo, que mostra os dois durante uma aparente relação sexual em que a vĂ­tima aparece deitada sobre uma cama, de costas, e com os pés e mãos amarrados. Na cama, ao lado da vĂ­tima, hĂĄ uma folha de papel com itens que o juiz vai riscando aos poucos — segundo a mulher, são os motivos pelos quais, para ele, ela deveria ser castigada. É possĂ­vel ouvir a voz de Maurici JĂșnior, que dĂĄ tapas nas nĂĄdegas da vĂ­tima com uma palmatória.

HĂĄ, então, o seguinte diĂĄlogo:

Valmir Maurici JĂșnior: "VocĂȘ se faz de cretina como meio de vitimização... vocĂȘ quer parar? TĂĄ chorando?

VĂ­tima: ela sinaliza que não com a cabeça: "Não tem dor no corpo", diz.

Valmir: "Dor no que?"

VĂ­tima: "Na alma".

Valmir: "Mas a gente tĂĄ fazendo o corpo doer pra alma sarar".

No final da gravação, ele pergunta se a mulher gostaria de ser "penetrada", e ela mexe a cabeça em sinal de positivo.

Em entrevista, a vĂ­tima disse que não consentia com relações assim e que não tinha opção:

"Na verdade, eu nunca consenti com aquelas coisas. Eu não tinha opção. Então, a violĂȘncia eu nunca consenti com nenhuma violĂȘncia. Mas eu era casada", disse a mulher. Ela afirmou ter ficado dois dias de cama depois da cena. E que "não tinha nada de fetiche" na situação.

O fato de a mulher ter levado o cofre da casa do casal fez Valmir Maurici JĂșnior acusar a esposa de furto qualificado. O advogado Luciano Katarinhuk, que defende a mulher, diz que a casa era dela também, porque ambos viviam juntos, e que não houve furto. O material do cofre foi encaminhado para perĂ­cia pelo Ministério PĂșblico.

Nele estavam, entre outros, fotos em que o juiz aparece carimbando nas nĂĄdegas mulheres com o carimbo funcional. Valmir Maurici JĂșnior também filmava mulheres escondido.

A PolĂ­cia Civil pediu o arquivamento do inquérito contra a mulher. O Ministério PĂșblico decidirĂĄ se oferece ou não denĂșncia à Justiça sobre o caso.

A vĂ­tima conta que tentou manter o casamento, mas foi entrando em desespero e chegou a tentar suicĂ­dio:

"Passava pela minha cabeça: por que eu to passando por isso? (...) Por que ele faz isso comigo? Eu tinha vergonha. Eu só queria manter meu casamento. Não queria ser julgada socialmente pelas pessoas. Eu só queria que aquilo acabasse logo. Era horrĂ­vel. Um sentimento de culpa muito grande. De acreditar que de certa forma eu merecia aquilo. Eu cheguei a tentar suicĂ­dio."

Ela dizia se sentir culpada na relação e que era humilhada pelo juiz:

"Eu queria morrer. As acusações eram muito grandes, sabe? Nunca ele estava errado. Era sempre a minha culpa. Do jeito que ele falava, do jeito que me humilhava, me chamava de burra, de fraca, que era patética. Intelectualmente ele destruĂ­a. E eu não aguentava, porque isso era todos os dias", afirmou.

'Pessoas influentes e poderosas'

Ela disse que, ao sinalizar ao marido que o denunciaria, ele a intimidou mencionando a própria rede de contatos:

"Ele falava: pode ir pra polĂ­cia. Leve seus vĂ­deos. Quando vocĂȘ chegar na delegacia, eu vou ser avisado. Porque eu sou um juiz, e vocĂȘ é só mais uma mulher louca. Não vai acontecer nada comigo. Eu nunca vou preso, eu tenho os amigos certos, pessoas influentes e poderosas. VocĂȘ só vai passar vergonha, vocĂȘ vai ser ridicularizada".

Além de magistrado do Tribunal de Justiça, Maurici JĂșnior foi professor do curso de juiz de direito no cursinho Complexo de Ensino Renato Saraiva (Cers). Diante da denĂșncia exclusiva revelada pelo g1, o Cers disse que que "repudia qualquer ato de violĂȘncia contra a mulher".

A mulher vive longe de São Paulo atualmente. Em razão da medida protetiva, Valmir Maurici JĂșnior não pode manter contato com ela, com os pais dela e com familiares, nem se aproximar deles. Ela teve episódios de depressão, ansiedade e, em dezembro, chegou a ser internada com quadro psicótico, de acordo com laudos médicos a que o g1 teve acesso.

Sobre como vai tocar a vida, a mulher afirma:

"Eu não tenho vida mais. Perdi vontade de tudo, perdi vontade até de viver". Questionada sobre o que a confortaria, respondeu: "Saber que outras mulheres não vão passar o mesmo que eu passei. Porque é um preço muito alto (...) A gente nunca... uma mulher não entra num relacionamento pensando que vai ser abusada e violentada de vĂĄrias formas. Eu entrei com um sonho e eu saĂ­ com um pesadelo."

O que diz o juiz citado

Nota divulgada em 27 de março: "A defesa técnica do magistrado, por seus advogados Marcelo Knopfelmacher e Felipe Locke Cavalcanti, nega veementemente os fatos que lhe são imputados e repudia com a mesma veemĂȘncia vazamentos ilegais de processos que correm em segredo de Justiça".

Nota divulgada em 11 de abril: "A defesa técnica do magistrado, por seus advogados Marcelo Knopfelmacher e Felipe Locke Cavalcanti, tem plena confiança na Justiça e no restabelecimento da verdade uma vez instalado o contraditório e exercido o direito de defesa em sua plenitude".
Fonte: G1
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