Na última semana, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu a obrigatoriedade do uso de máscaras em aviões e aeroportos no Brasil. A agência continua recomendando o uso do equipamento, mas não irá mais barrar os passageiros que não estiverem usando.
Exigida desde 2020, a máscara tem sido um importante item de segurança no combate à pandemia de Covid-19, e chegou a ser requisitada em todos os estados brasileiros como medida de saúde coletiva.
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Dois anos depois, a regulamentação em cada estado foi se adaptando à diminuição dos casos de infecções pelo coronavírus. Em São Paulo, por exemplo, o uso de máscaras deixou de ser obrigatório em locais fechados, como bares, restaurantes, mercados e shoppings, em março de 2022.
Mas no transporte público do estado o equipamento continua sendo exigido, seja nos ônibus, nas estações e dentro dos vagões do metrô e da CPTM. Nos hospitais o uso também é obrigatório.
Para entender quais são as recomendações do ponto de vista de pesquisadores e infectologistas em relação à proteção contra Covid-19 e uso das máscaras, entrevistamos especialistas que fizeram uma análise do atual cenário e passaram orientações de segurança. Confira.
As mudanças na legislação e a “volta ao normal” de atividades que proporcionam aglomeração, como shows e eventos esportivos, dão a impressão de que a pandemia já não preocupa mais. Mas, segundo especialistas, o cenário ainda merece atenção.
“A pandemia não acabou. Estamos em um cenário epidemiológico com diminuição do número de casos e consequentemente, menor risco de transmissão”, pondera o professor da EPM-Unifesp Eduardo Medeiros, médico infectologista e Coordenador Científico da Sociedade Paulista de Infectologia (SPI).
A opinião de Medeiros é unânime entre todos os especialistas entrevistados. Anna Sara Levin, infectologista e Chefe da Divisão de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do HCFMUSP complementa dizendo que é a Organização Mundial da Saúde quem determina o fim da pandemia e, até o momento, não houve nenhum comunicado nesse sentido. “No entanto, estamos num momento melhor [da pandemia]”, reconhece.
De fato, os casos e os óbitos estão diminuindo, segundo os dados do Ministério da Saúde. Em um ano no qual já foram registradas mais de 900 mortes em um único dia – como aconteceu em fevereiro de 2022 –, o balanço da última sexta-feira (19), que apontou 142 óbitos pela doença, parece um indicativo de que a situação está melhor.
“Mas nós ainda temos 30 mil casos de covid sendo notificados por dia, e a mediana de 170 pessoas que morrem pela doença diariamente”, alerta o professor Celso Granato, pesquisador associado do laboratório de Virologia do Instituto de Medicina Tropical da FMUSP. “Por conta dos altos números do início da pandemia, a gente se acostuma e acha que não é tanto assim. Mas para uma doença passível de proteção por vacina, esse número ainda é muita coisa”.
Levin afirma que o risco de pegar Covid-19 continua existindo, por isso, a máscara ainda é recomendada, mas não obrigatória. “No Brasil, a média móvel de mortes é de 173. No entanto, estamos numa situação muito melhor do que nas épocas piores da pandemia e temos uma grande parte da população vacinada com 3 doses. Por isso, existe um certo afrouxamento das medidas que diminuem a transmissão do vírus”.
O infectologista da FMUSP também compartilha da mesma opinião, dizendo que o risco é bem menor do que há 4 ou 5 meses atrás. “Aqui no laboratório, chegamos a fazer 12 mil exames [de detecção de covid] por dia. Agora fazemos mil. Além da diminuição pela busca, a positividade que era de 60%, agora é de 10%”.
Não é seguro. Segundo Medeiros, os aeroportos são locais de alta circulação de pessoas, viajantes de outros países que podem transmitir variantes diferentes do SARS-CoV-2. “No transporte público, muitas vezes, eles estão superlotados e mal ventilados aumentando a chance de transmissão”, pontua.
O infectologista Rogério Vitor conta que mesmo com a diminuição do número de casos, e concomitantemente da transmissão, ainda é arriscado não utilizar máscara quando rodeado de pessoas como nessas situações.
“Há o risco de adquirir alguma doença respiratória. A sugestão permanece sendo utilizar máscara sempre que em ambientes fechados e distanciamento menor que 1m ou 1,5m de outras pessoas”.
A transmissão da Covid-19 ocorre principalmente por gotículas durante a fala, espirro e tosse. Lugares fechados, especialmente mal ventilados, aumentam a chance de transmissão, explica o infectologista da SPI.
Mas isso não significa que ao andar sem máscara em grandes aglomerações ao ar livre o indivíduo esteja seguro. “Lugares abertos têm menor chance de transmissão do vírus, porém em eventos com multidões o risco aumenta, pois as pessoas ficam muito próximas”, avalia Medeiros.
O que não significa que ir ao parque sem máscara seja um risco à saúde. “Ao ar livre, em locais em que é possível ficar distante pelo menos 1 metro de outras pessoas, o risco de infecção é baixo, e podemos ficar sem máscara”, garante a médica do Hospital das Clínicas.
Os especialistas afirmam que a máscara funciona como um importante barreira contra doenças de transmissão respiratória, o que inclui a Covid-19, gripe, vírus sincicial respiratório e demais infecções respiratórias.
Apesar da varíola dos macacos ser uma doença respiratória, ela pode ser transmitida por contato com as lesões, sendo essa a principal forma de transmissão.
Contudo, Granato conta que em alguns casos, inclusive no Brasil, foi relatada a transmissão de monkeypox entre pessoas que moravam na mesma casa, sem ter o contato direto com as lesões. Por isso, ele recomenda o uso da máscara.
“Usar máscara quando há o contato com uma pessoa doente vai te proteger e a pessoa doente também pode usar como sinal de respeito e proteção ao próximo”, indica.
Vários estudos comprovaram que as máscaras PFF2 são recomendadas por oferecerem maior proteção contra o coronavírus. Porém, o preço desse modelo é mais alto, quando comparado às máscaras cirúrgicas.
Granato esclarece que o ideal é analisar caso a caso na hora de escolher a máscara. “Depende do ambiente em que a pessoa está. Se for um hospital, onde o risco de contaminação é maior, a PFF2 é a mais indicada. Já em outros ambientes de baixo risco, é possível optar pela máscara cirúrgica”.
Em relação às máscaras de pano, muito utilizadas no início da pandemia, não são indicadas em nenhuma situação por não conferirem proteção adequada.
Estamos em um momento de diminuição dos casos, porém ainda estamos com transmissão da Covid-19, observa Medeiros. “É importante observar este cenário epidemiológico e se o número de casos continuar diminuindo, podemos avaliar novas medidas de flexibilização. Esse processo é muito dinâmico e difícil de fazer uma previsão”.
O infectologista da SPI lembra que muitas previsões durante a pandemia não se confirmaram. “Fomos muito afoitos e fizemos previsões sem levar em consideração as características do vírus como a capacidade de realizar mutações que aumentam a capacidade de transmissão e de evasão imunológica tanto das vacinas como da imunidade pós infecção”.
Para Levin, o exemplo de alguns países, que têm como costume utilizar máscaras para prevenir a disseminação de outras doenças com mais frequência do que no Brasil pode servir de espelho. “Talvez isso seja incorporado parcialmente na nossa cultura também”.