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A distopia ficou próxima da realidade: Namíbia, Não! volta aos palcos

Por Da Redação

04/08/2022 às 05:54:18 - Atualizado há

Ícaro Silva e Aldri Anunciação na nova versão de Namíbia, Não!

Quando Aldri Anunciação pegou a caneta para escrever as primeiras linhas do texto de Namíbia, Não! o Brasil era completamente diferente, ainda mais quando se leva em consideração a fatia mais pobre do país. Em 2009, a desigualdade de distribuição de renda no país acumulava queda de 5,6% em cinco anos e a renda média real subira 28%. Os números são do comunicado Mudanças Recentes na Pobreza Brasileira, feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O cenário em 2022 é bem diferente e a pobreza atingiu números recordes com 47,3 milhões de brasileiros terminando o último ano na pobreza, de acordo com o levantamento realizado pelo Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social - Imds. Uma realidade sofrida na pele pela  população negra, retratada no texto, vencedor do Prêmio Jabuti em 2012, e que marcou a estreia de Lázaro Ramos na direção de um espetáculo adulto.  

A distopia se aproximou da realidade e é assim que o espetáculo volta a ser apresentado em Salvador, onde começou sua jornada em 2011. Namíbia, Não! entra em cartaz nesta sexta (5) , às 20h, na Sala do Coro do Teatro Castro Alves, onde segue em cartaz até dia 28. Os ingressos para a estreia estão esgotados.

Eu tenho dois sentimentos em relação ao retorno da peça. Primeiro, uma alegria profunda por voltar com 99% da equipe, mesma equipe de som, vídeo, áudio, direção de assistência, direção do palco, de encenação. Esse reencontro é muito bonito e mostra que a narrativa que pensamos encontrou seu público”, explica Aldri Anunciação, que também atua na montagem. 

O outro sentimento, no entanto, é de preocupação pelo caráter até premonitório que a peça, que inspirou o filme Medida Provisória, também dirigido por Lázaro, tomou ao longo de 10 anos. Veja só: em uma das cenas, o personagem André grita que não consegue respirar por onze vezes. A mesma frase dita por George Floyd, em 2020, quando foi morto por um policial americano. A frase foi o estopim do movimento Black Lives Matter .

“Esse aspecto visionário que as vezes a arte adquire falando da negritude mundial me deixa infeliz. Saber que após onze anos a gente precisa falar sobre isso, a gente fica sem conseguir respirar, há uma morte negra a cada 23 minutos”, diz Aldri.

Aldri Anunciação divide o protagonismo do espetáculo com o ator paulista Ícaro Silva, que vive atualmente o vilão Leonardo da novela Cara e Coragem, da TV Globo. Na primeira versão, o ator Flávio Bauraque viveu o papel. Filho de baiano, Ícaro diz que é uma alegria e uma responsabilidade encenar um texto negro aqui. “Salvador é a cidade mais importante pra negritude no Brasil”, afirma.


Texto mítico

Ícaro nunca tinha conseguido assistir  Namíbia, Não!. Por isso e por tudo que ouviu falar sobre a peça, afirma que ela tinha um caráter quase mítico em sua vida. “Me parece o fechamento desta mitologia  eu alcançar este lugar de poder falar no teatro sobre questões que me atravessam, com um texto premiado e que virou filme. Espero que o público se divirta muito também, pois, por mais que o texto seja denso, ele é pra causar reflexão com diversão”, observa.      

A peça narra a história de André e Antônio, advogados que são surpreendidos por uma Medida Provisória do Governo brasileiro, obrigando a todos os cidadãos com características que indiquem uma ascendência africana a regressarem a seus pretensos países de origem. Todos devem ser capturados e devolvidos às nações da África, sob o pretexto de “corrigir” o erro histórico da escravização dos africanos nas terras brasileiras. A partir daí, a narrativa se desenrola, contando a história de um Brasil do futuro, numa realidade distópica - já não tão distópica assim.

Ao longo de 10 anos, a peça acumula premiações pelo texto e levou cerca de um milhão de pessoas para os teatros em todo o Brasil. A nova temporada conta com audiodescrição e libras, promovendo maior acessibilidade. “Hoje temos uma população mais pressionada socialmente e o contexto faz com que a peça adquira um ar menos distópico e ganhe ar de crítica social realista. Em resumo, parece que o texto não muda, mesmo passando pela questão cinematográfica. Muda o contexto mundial e o olhar do público”, resume Aldri.

FICHA

Espetáculo: Namíbia, Não!

Estreia: sexta (5)

Onde: Sala do Coro do TCA

Quando: Sextas (20h), sábados (17h e 20h) e domingos (17h), até dia 28

Ingressos: R$ 50 |R$ 25. Venda no Sympla.
 

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