Educação APOIO AOS SURDOS

Prestes a completar 50 anos, Assumu ainda luta por direitos básicos e para derrubar preconceitos

Por O Bemdito

03/12/2023 às 22:10:30 - Atualizado há

Nossa cidade não tinha nem vinte anos quando ela foi criada. Em maio de 1974 nascia a Associação de Assistência aos Surdos de Umuarama, a Assumu, com o objetivo de defender os anseios e os direitos da comunidade surda regional.

A idade da ong nos leva a pensar que os umuaramenses começaram a se preocupar cedo com isso, o que é verdade, porém, passadas quase cinco décadas, ainda há muito por fazer para um atendimento eficaz, que garanta acessibilidade e vida mais digna aos que fazem parte deste grupo.

O direito ao acesso a uma boa educação formal sempre foi e continua sendo a principal bandeira da Assumo, entidade mantenedora da Escola de Educação Bilíngue Anne Sullivan, que atende no período da manhã 22 alunos e no período da tarde, 24 – da educação infantil [de 0 a 5 anos] ao fundamental [primeira etapa – do 1º ao 5º ano] e do EJA (Educação de Jovens e Adultos].

São alunos com níveis diferentes de deficiência auditiva [que vão do leve ao severo]. A maioria é de Umuarama, mas vêm também crianças de Cruzeiro do Oeste, Douradina, Mariluz, Cafezal e Esperança Nova.

"É uma escola estruturada como tantas outras, onde nossos alunos são atendidos de forma seriada, precisam de nota para passar, tem currículo, tem Projeto Político Pedagógicoâ?¦", diz a diretora Ligia Oliveira Neves, 44 anos, que convidou a reportagem de OBemdito para conhecer a escola. "Precisamos do apoio de vocês para mostrarmos para a sociedade o papel importante que desempenhamos aqui", mencionou, ao nos receber.

Aparecida Genovefa, 70 anos, aluna do EJA: nunca falta às aulas

É que, segundo ela, o preconceito ainda abala a reputação das escolas para surdo. "Nem todo surdo é mudo; sabendo disso, muitos pais de surdo ainda acreditam que se o filho aprender Libras para se comunicar, ele pode não aprender a falar; isso não tem nada a verâ?¦ O atraso na aceitação desse fato pode afetar o desenvolvimento cognitivo e emocional da criança; do contrário, ou seja, aprendendo a língua de sinais o mais cedo possível, ela vai conseguir interagir, se integrar à sociedade, exercer sua cidadania com mais segurança e satisfaçãoâ?¦ Isso é inclusão", defende a diretora.

Por acreditarem nisso, dirigentes da Anne Sullivan – Assumu, que está habilitada desde o ano de 2012, junto à Secretaria de Estado da Educação, como escola bilíngue, lutam por melhorias. "As aulas aqui acontecem em Libras, claro, mas não custa lembrar que todas as disciplinas são traduzidas para Libras, nossos professores são bilíngues, temos também a disciplina de Libras, ministrada por professoras graduadas em Letras/Libras, enfim, é uma estrutura arrojada eâ?¦ olha só, não temos uma biblioteca, não temos livros didáticos em Librasâ?¦ Isso nos deixa desolados!".

Professora Nádia com alunas do EJA

A diretora afirma que a criança surda que cursa as primeiras séries na Assumu segue os estudos nas escolas regulares, da segunda etapa do fundamental em diante, com muito mais confiança. "Porque sai daqui fluente em Libras; esse é o diferencial", acentua Ligia, que é mãe de surda. "Minha filha estudou aqui até o 5º ano do fundamental, depois foi para o Colégio Estadual Bento Mossurunga; lá está indo muito bem, tem ótimas notas, por quê? Porque foi já fluente em Libras", ratifica.

Além da biblioteca, os dirigentes querem um ginásio de esportes. "Temos espaço para construí-loâ?¦ sonhamos com isso", conta a diretora, apontando para um terreno enorme nos fundos da Assumu, que há poucos meses montou um parquinho. "Não tínhamos! Nosso secretário foi no depósito da prefeitura, encontrou um lá abandonado, juntou as peças, trouxe pra cá, reformamos, e aí está", relata.

Outro sonho: a instalação de um Centro Auditivo em Umuarama, espaço responsável por diagnosticar corretamente a perda auditiva dos pacientes, onde especialistas indicam o tratamento e o aparelho auditivo mais adequados para cada caso e auxiliam na adaptação desses aparelhos. "Não temos esse espaço; toda pessoa surda daqui tem que ir para Maringá, Cascavel ou Toledo para isso", lamenta Ligia.

Assumu recebe alunos de diferentes cidades da região

Arte e esporte

No contraturno escolar, os alunos também recebem apoio; várias atividades educativas, culturais, artísticas e esportivas fazem parte da rotina deles. Tudo ministrado em Libras, tudo para "formar cidadãos para o mundo, pessoas com autonomia".

"Por termos essa missão, nós nos preocupamos também em aplicar conteúdos que conscientizam, para que nossos alunos aprendam a batalhar por seus ideais e fortaleçam sua identidade, porque a deficiência não os torna menos capazes! Zelamos para torná-los aptos para servir a comunidade, para terem suas famílias, seu emprego, enfim, para levar uma vida mais digna!"

Aluno estuda sistema nervoso no computador

Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontam que 5% da população brasileira é composta de pessoas que apresentam alguma deficiência auditiva. Essa porcentagem significa que mais de 10 milhões de cidadãos apresentam a deficiência e 2,7 milhões têm surdez profunda, ou seja, não escutam nada.

"É significativa a parcela de surdos no Brasil enfrentando muitas barreiras no acesso a diversos serviços digitais ou presenciais; isso tem que mudar! E rápido! Precisamos dar visibilidade à educação bilíngue! Com o ensino da Língua Portuguesa como segunda língua e o ensino da Libras como primeira língua, damos oportunidade a esse indivíduo de adquirir conhecimento e se apropriar dele. Deste modo pode seguir seus estudos, pois não há limite para a educação e aprendizado do surdo", sustenta a professora Lígia, que é pedagoga e especialista em Educação Especial com ênfase em Deficiência Auditiva.

Cabine de audiometria

Histórias cruzadas

O presidente da Assumu, Eduardo Alberto Megda, é surdo profundo; entrou na Assumu com um ano de idade e estudou nela até a adolescência. Depois, teve carreira acadêmica brilhante: três cursos de graduação [Pedagogia, Educação Física e Letras/Libras]; e oito cursos de pós-graduação. Foi professor de Educação Física e atuou como professor regente de sala por sete anos na Assumu. Hoje, é técnico pedagógico do CAS (Centro de Apoio ao Surdo e aos Profissionais da Educação dos Surdos), do Núcleo Regional de Educação.

A equipe de professores da Assumu conta com quatro surdas. Entre elas está Nádia Cristiane Valentim, 27 anos, concursada do Estado. Ela é graduada em Pedagogia e em Letras/Libras e pós-graduada em Libras e em Educação Especial. Começou os estudos na Assumu, com 3 anos de idade. Leciona no EJA.

70 anos de idade tem Aparecida Genovefa, aluna do EJA da Assumu desde 2014. Até então, nunca saia de casa, porque não conseguia se comunicar. Mora distante sete quilômetros, mas nunca falta às aulas e nem às atividades extraclasses. Diz que ama a escola porque "todos a entendem".

Espaço das aulas de artes marciais

Níveis de surdez – entenda

Para que se tome conhecimento da deficiência é necessário a realização do exame audiométrico, onde o especialista consegue medir o nível de surdez da pessoa. Atualmente a medicina traz quatro níveis de surdez: leve, moderada (ou média), severa (ou grave) e profunda.

Pessoas com surdez no grau leve conseguem ouvir sons entre 21 a 40 dB; elas têm dificuldade em entender sons suaves, como o canto de pássaros.

No nível Moderado é possível ouvir barulhos entre 41 a 70 dB; a pessoa tem dificuldades em manter uma conversa, pois não ouve com clareza. Os sons mais fáceis de ouvir são latidos de cachorro, choro de bebê e som de aspirador de pó.

No nível severo as pessoas não escutam nenhum som de fala, poucos sons são percebidos. O som mais fácil de escutar está entre 71 a 90 dB como um cortador de grama.

Já na surdez profunda o surdo ouve pouquíssimos sons; o barulho mais suave que ouve está a partir de 91 dB, como um helicóptero, um rojão, vuvuzela, bateria de escola de samba e show de rock.

Trabalhos das aulas de educação artística colorem os corredores da escola
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Trabalho sobre consciência negra: reflexão faz parte do cotidiano escolar
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Parquinho recém-instalado: chance para as crianças brincarem
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Trabalho de aluno anuncia o Natal

Fonte: O Bemdito
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