Jornalistas e política: o microfone que vira palanque e a fronteira entre notícia e poder

Com a filiação de Wilson Soler ao PSB, o Paraná volta a discutir o papel dos profissionais de imprensa na disputa eleitoral e os limites entre informar e representar

Por Por Luciana Pombo - Blog da Luciana Pombo | Jornalismo que não arquiva a verdade em 04/11/2025 às 13:29:07
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A política paranaense ganhou um novo nome conhecido da televisão. O ex-apresentador da RPC, Wilson Soler, filiou-se ao PSB, partido do deputado federal Luciano Ducci, e pretende contribuir para que a legenda conquiste ao menos uma cadeira na Câmara Federal em 2026. A movimentação reacende um tema recorrente e incômodo: por que tantos jornalistas migram para a política, e quantos realmente conseguem se eleger?

Soler é reconhecido nos bastidores do jornalismo por sua postura ética, por anos de atuação equilibrada e pelo respeito à informação. A filiação dele não representa uma ruptura com o jornalismo, mas um passo adiante na tentativa de colocar sua experiência de comunicação a serviço da vida pública. É o mesmo caminho que outros nomes da RPC já seguiram. Jasson Goulart, hoje vereador em Curitiba pelo Republicanos, vai tentar uma vaga na Assembleia Legislativa. Herivelto Oliveira, eleito pelo Cidadania, preferiu não disputar a reeleição, mas deve concorrer a deputado estadual em 2026.

Os dois são exemplos de uma transição relativamente recente: jornalistas que deixam o telejornal para testar sua popularidade fora das câmeras. Entre os ex-profissionais de televisão, há mais curiosidade do que sucesso. Um levantamento do Congresso em Foco, em parceria com o Instituto Verifica, mostra que menos de 15% dos jornalistas diplomados que concorreram a cargos políticos desde 2010 foram eleitos. O número sobe quando se consideram comunicadores sem diploma — apresentadores de programas policiais, comentaristas esportivos ou figuras de entretenimento —, que transformam a audiência popular em capital eleitoral.

A diferença é nítida. Jornalistas de formação acadêmica, acostumados à mediação e ao distanciamento crítico, tendem a disputar votos em campanhas mais racionais, com discursos de integridade e transparência. Já apresentadores de apelo popular recorrem à emoção, ao improviso e ao personagem. O resultado é previsível: os mais midiáticos costumam se eleger com facilidade; os mais técnicos, nem sempre.

No Paraná, nomes como Gilberto Ribeiro, que vinha de programas policiais, e Jocelito Canto, radialista de Ponta Grossa, transformaram a audiência em votos. Já jornalistas de redação, como os que vieram da RPC ou da imprensa escrita, enfrentam resistências maiores: o público confunde credibilidade com distância e nem sempre transfere o prestígio profissional para a urna.

A repórter Cristina Graeml, também egressa da Globo, é outro exemplo. Tentou a Prefeitura de Curitiba em 2024, chegou ao segundo turno e foi derrotada por Eduardo Pimentel, do PSD. Agora planeja concorrer ao Senado Federal em 2026. Seu desempenho reforçou a tese de que visibilidade é condição necessária, mas não suficiente, para sucesso eleitoral.

O caso de Wilson Soler, no entanto, tem outro sabor. Ele entra na política por um partido de centro-esquerda com histórico de diálogo, o PSB, e não como outsider, mas como cidadão com trajetória profissional sólida. Essa diferença é essencial. Jornalismo e política se tocam na mesma linha de tensão: ambos lidam com a palavra, com a confiança e com a capacidade de influenciar. Mas a transição só se sustenta quando a credibilidade não é usada como palanque, e sim como instrumento de serviço público.

Historicamente, o Brasil teve grandes nomes que migraram do jornalismo para a política. Carlos Lacerda e Tenório Cavalcanti fizeram isso no século XX com impacto nacional, embora representassem um modelo de política combativa e personalista. Em tempos recentes, jornalistas diplomados que se aventuraram nas urnas incluem Mara Gabrilli, hoje senadora, e Cristovam Buarque, que conciliou vida acadêmica e comunicação política. Mas a estatística é cruel: a cada dez jornalistas que tentam mandato, oito voltam às redações ou ao anonimato.

A fronteira entre o repórter e o político é tênue. Quando bem trilhada, reforça a importância da ética e da empatia; quando mal administrada, contamina a independência que o jornalismo preza. O desafio de Wilson Soler será exatamente esse: usar a escuta de quem entrevistou centenas de histórias como ferramenta para construir políticas públicas reais.

É legítimo que jornalistas, como qualquer cidadão, queiram participar da política institucional. O risco está em quem confunde microfone com mandato e transforma popularidade em passaporte automático para o poder. Jornalismo de verdade forma consciência; populismo de palco apenas repete bordões.

O eleitor do Paraná, acostumado a ver antigos rostos da televisão pedindo voto, amadureceu. A experiência mostra que o público já diferencia o carisma de um comunicador do preparo de um gestor. Por isso, a nova geração de profissionais que ingressam na política — como Soler, Goulart e Herivelto Oliveira — precisa ser julgada menos pela imagem e mais pela capacidade de propor, ouvir e entregar.

Wilson Soler tem pela frente um caminho de expectativa e responsabilidade. O PSB ganha um quadro com reputação sólida, mas também o compromisso de provar que credibilidade não se herda: constrói-se, agora, na arena mais difícil de todas — a política.

Fonte: Fontes: PSB Paraná; Tribunal Superior Eleitoral; Congresso em Foco (Levantamento 2024 sobre jornalis

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