Foto: Agência Brasil - EBC
O Brasil segue inovando na arte de distorcer a Constituição: agora, tem parlamentar querendo transformar o mandato em home office direto da prisão ou do exterior. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, precisou lembrar o óbvio ao Supremo Tribunal Federal: deputado trabalha no plenário, não na videoconferência. Mas para quem vive de privilégios e selfies em Miami, o cargo público parece mais passaporte diplomático do que dever cívico.
O procurador-geral Paulo Gonet enviou ao STF parecer contrário à possibilidade de parlamentares exercerem o mandato de forma remota.
O documento foi anexado ao mandado de segurança do ex-deputado Chiquinho Brazão, acusado de ser mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco.
A defesa alegava que as faltas de Brazão não deveriam ser consideradas, já que ele está preso preventivamente.
Gonet foi categórico: a Constituição exige presença física no exercício do mandato e não há "missão parlamentar" que se faça de dentro da cadeia.
"O exercício do mandato não prescinde da presença física do deputado ou senador nas sessões", escreveu o procurador-geral.
Em outras palavras: deputado preso não é deputado em missão, é réu.
Chiquinho Brazão teve o mandato cassado em abril por faltas reiteradas às sessões da Câmara. Está preso, acusado de mandar matar uma mulher negra, lésbica e favelada símbolo da resistência política no Brasil.
E ainda tenta se vitimizar como se fosse injustiçado por "faltar ao trabalho".
A tese da defesa é um tapa na cara do bom senso: se o mandato fosse remoto, bastaria um notebook na cela e um fundo verde para transformar Bangu em anexo da Câmara dos Deputados.
O parecer de Gonet também reforça o caso do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que foge do plenário há meses.
Desde fevereiro, o "03" está nos Estados Unidos, em plena militância internacional.
É acusado de fomentar sanções comerciais contra o Brasil e de apoiar a Lei Magnitsky, que pune autoridades por violação de direitos humanos ironicamente, a mesma pauta que seu pai sempre desprezou.
Pediu licença de 120 dias, encerrada em 20 de julho. Desde então, está simplesmente... ausente.
O PL tentou uma jogada para salvá-lo: indicar Eduardo como líder da minoria cargo que dispensa presença em plenário. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), barrou a manobra. E pela primeira vez, acertou.
Eduardo Bolsonaro transformou o cargo público em uma espécie de "franquia da família" mistura de influencer político e representante informal da extrema-direita global.
Vive de agenda com republicanos trumpistas e discursos conspiratórios.
Enquanto isso, o contribuinte brasileiro paga salário, verbas de gabinete e mordomias para um parlamentar que atua a 7 mil quilômetros de distância.
É o "mandato remoto" dos sonhos: longe da realidade, perto do privilégio.
O parecer de Paulo Gonet é mais do que um posicionamento jurídico é um recado:
? Não existe democracia por Zoom.
? Mandato é trabalho presencial.
? A imunidade parlamentar não é licença para a impunidade.
Mas o episódio revela o que o bolsonarismo e parte do Centrão têm em comum: a tentativa constante de reinterpretar a lei em causa própria.
Março de 2024: Chiquinho Brazão é preso, acusado de mandar matar Marielle Franco.
Abril: Câmara cassa o mandato do ex-deputado por faltas às sessões.
Julho: Termina licença de Eduardo Bolsonaro; ele permanece fora do país.
Outubro: Gonet envia parecer ao STF contra o "mandato remoto".
Agora: oposição tenta forçar brechas regimentais para blindar aliados ausentes ou presos.
No país em que se tenta transformar presídio em gabinete e exílio em missão oficial, o parecer da PGR soa quase revolucionário: parlamentar tem que trabalhar e no Brasil.
A Constituição é clara, mas a elite política insiste em achar que as regras são opcionais, desde que o sobrenome seja Bolsonaro ou o currículo tenha "réu" no rodapé.
O Congresso, que já vive de escândalos, agora flerta com o ridículo: transformar a prisão em plenário e a covardia em liderança.
Fonte: Agência Brasil