O trabalho foi conduzido entre 2022 e 2023 por cinco pesquisadores e analisa dados pré-pandemia (perĂodo entre 2017 e 2018) coletados pela Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do Instituto Brasileiro de Geografia e EstatĂstica (IBGE), além de textos pĂșblicos de organizações de diferentes setores da sociedade – comercial, movimentos sociais, entidades profissionais e academia.
Em entrevista à AgĂȘncia Brasil, a coordenadora do estudo, Veruska Prado, destacou que as desigualdades no acesso, no consumo e na produção de alimentos atualmente são tratadas de forma generalizada e, em alguns momentos, até mesmo naturalizadas. "O tema das desigualdades de raça, gĂȘnero e classe estĂĄ presente no discurso de diferentes segmentos da sociedade brasileira. A grande questão é que isso é algo que estĂĄ tão presente na formação do Brasil e no cotidiano dos brasileiros e brasileiras.""Todos nós, quando saĂmos de casa, acabamos vendo pessoas em situação de rua, sabemos de pessoas que estão passando fome e outras violações aos direitos humanos a que a gente cotidianamente assiste. Isso estĂĄ um pouco naturalizado, como se fosse uma situação impossĂvel de ser modificada. Então, o tema é tratado", disse Veruska.
A pesquisadora alerta para a necessidade de uma abordagem mais especĂfica nas falas sobre desigualdades relacionadas ao acesso à alimentação. "Todas as organizações da sociedade civil, sejam aquelas vinculadas ao setor privado, ao setor pĂșblico, aos movimentos sociais e à academia trazem esse tema. No entanto, essa forma de trazer estĂĄ generalizada e não é especĂfica. A questão da alimentação, por interferĂȘncia de raça, gĂȘnero e classe social, mesmo dentro desse grupo, precisa ter olhares diferenciados."
"HĂĄ, dentro desse grupo de pessoas em situação de maior vulnerabilidade para segurança alimentar, pessoas ou grupos de indivĂduos que tĂȘm riscos maiores de isso acontecer em suas vidas. Por que isso acontece? A explicação que a gente estĂĄ trazendo é que são questões estruturais no Brasil relacionadas à raça, gĂȘnero, desigualdades existentes no acesso ao mercado de trabalho e na garantia de meios para a sobrevivĂȘncia e vida digna."
Veruska lembrou que o perĂodo analisado no estudo inclui a fase anterior à pandemia de covid-19 e disse que, mesmo naquela época, jĂĄ havia indicativos de que lares chefiados por mulheres, por exemplo, vivenciavam fome e outras formas de insegurança alimentar, como o medo de não ter acesso ao alimento até o final. Outra realidade identificada pelos pesquisadores nesse perĂodo inclui adaptações alimentares nas famĂlias, como quando a mulher passar a comer menos pra que as crianças possam manter sua alimentação.
"No mundo de hoje e no Brasil que a gente tem, pós-pandemia, com o tanto de gente que ainda estĂĄ em situação de fome, não dĂĄ mais para a gente tratar as desigualdades do ponto de vista de algo generalizado na população. Dentro das pessoas que estão passando fome e em situação de insegurança alimentar, com violação do seu direito humano à alimentação e nutrição adequadas, é fundamental que a gente seja mais assertivo e especĂfico nas nossas ações", concluiu.
AgĂȘncia Brasil